O IMORTAL QUE SEMPRE LUTOU PELA VIDA

Por Rosayne Macedo

Cada vez mais a Associação Brasileira de Letras prova que não é uma casa apenas da literatura, embora a autoria de livros seja uma exigência para quem quer se candidatar a uma vaga de imortal. Depois da música e das artes cênicas, é a vez da ciência e da medicina tomarem assento na ABL. O momento não poderia ser mais adequado, em meio às trevas que vivemos nesses tempos de negacionismo e obscurantismo. Após a recente chegada de Gilberto Gil e Fernanda Montenegro, o médico e escritor Paulo Niemeyer Filho, de 70 anos, assumiu a cadeira de número 12, antes ocupada pelo professor e crítico literário Alfredo Bosi, que morreu em abril do ano passado, justamente de Covid-19.

“É uma honra ser, agora, o único representante da Ciência ou Medicina. Eu acho que a academia tem que representar todas as formas de cultura. E a Medicina é uma manifestação de cultura humana”, afirmou.

Autor de livros como “O que é ser médico” e “No labirinto do cérebro”, Niemeyer Filho disse, em seu discurso de posse, que coube a ele prorrogar a presença da ciência na ABL, justamente no momento em que o mundo científico sai vitorioso no combate ao coronavírus. “A covid-19 levou amigos e parentes e a Academia Brasileira de Letras não ficou imune, com a perda de um dos seus membros mais ilustres, Alfredo Bosi, professor e acadêmico que não resistiu à doença”.

Sobrinho do arquiteto Oscar Niemeyer e filho do também neurocirurgião Paulo Niemeyer, o novo imortal lembrou ainda que os médicos sempre estiveram presentes desde a fundação da Academia. Ele é o 24° médico a participar da história da ABL. Ivo Pitanguy, por exemplo, foi da ABL de 1991 até 2006, quando faleceu. O acadêmico falou ainda sobre a vida dedicada à medicina e relembrou os desafios da ciência.

 “Coube a mim prorrogar a presença da ciência nesta casa, justamente no momento em que o mundo científico sai vitorioso no combate ao coronavírus. A Academia abre hoje as suas portas para um médico que trabalha pela vida, e que é fervorosamente a favor das pesquisas científicas, das vacinas e das artes”, agradeceu Paulo Niemeyer Filho.

“É uma honra ser, agora, o único representante da Ciência ou Medicina. Eu acho que a academia tem que representar todas as formas de cultura. E a Medicina é uma manifestação de cultura humana”

 O caminho para chegar até ali esbarrou em uma certa resistência. Eleito com 25 votos dos 34 imortais votantes em 18 novembro de 2021, Niemeyer era o legítimo herdeiro da cadeira, disputada também pelo educador indígena Daniel Munduruku e pelo escritor Joaquim Branco. Na semana que antecedeu a votação, um documento com mais de 100 assinaturas chegou a circular reforçando a candidatura de Munduruku, por sua representatividade indigena e inúmeros livros infanto-juvenis. Mesma pressão ocorreu três anos atrás com Conceição Evaristo.

 “É a vitória da ciência, é a importância da ciência. E isso já aconteceu no passado, quando houve a revolta da vacina, que foi um momento muito grave, e Oswaldo Cruz foi consagrado e eleito para academia. A academia sempre esteve presente nesses momentos de defender os valores civilizatórios”, finaliza Niemeyer.

Paulo Niemeyer Filho nasceu no dia 9 de abril de 1952 e dedica-se ao estudo da neurocirurgia desde 1975, quando graduou-se pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É especialista em cirurgias de tumores cerebrais, aneurismas, microcirurgias vasculares e  más formações. Em 1979, introduziu, no Brasil, nova técnica microcirúrgica para tratamento de nevralgia do trigêmeo, responsável pela sensibilidade da face. É autor dos livros ‘O que é ser médico’, ‘No labirinto do cérebro’, ‘Memórias Profissionais’.

Foi diretor do Instituto de Neurocirurgia da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro e presidente da Sociedade de Neurocirurgia do Rio de Janeiro. Atualmente, é diretor do Instituto Estadual do Cérebro Paulo Niemeyer e professor titular de neurocirurgia da Pontifícia Universidade Católica (PUC RJ), além de ser membro titular da Academia Nacional de Medicina (ANM), da Sociedade Norte-Americana ‘Congress of Neurological Surgeon’ e do ‘Neurotraumatology Committee do Word Federation of Neurological Societies’. É ainda membro do Conselho da Fundação do Câncer.