Ele é considerado uma espécie de certidão de nascimento da gastronomia, um clássico escrito na conturbada França do século XVIII, para paladares delicados e desapressados. Naquela época, com a derrocada da monarquia, grandes cozinheiros se viram sem seus empregos nos castelos, palácios e mansões da nobreza. Passaram então a vender seus pratos em estabelecimentos públicos. Nasciam os primeiros restaurantes, dos mais simples aos mais sofisticados. Comer e beber começou a alcançar um novo status, e palavras como sommelier ou gourmandise começaram a circular. Logo surgiram os primeiros livros de culinária, mas nenhum jamais foi tão influente quanto “A Fisiologia do Gosto”, de Jean Anthelme Brillat-Savarin, publicado em 1825 e lançado no Brasil pela editora Companhia da Mesa. Almoços e jantares nunca mais foram os mesmos.
“A Fisiologia do Gosto” não é exatamente um livro de receitas _ embora as tenha aos montes. É recheado de anedotas, memórias, reflexões filosóficas e ponderações científicas. Como beber industrialmente e permanecer de pé? A resposta está lá: sorva, não vire. “O álcool é o monarca dos líquidos e leva o paladar a seu mais alto grau de exaltação: suas diversas preparações abriram novas fontes de prazeres”, diz o autor _ que passou a usar a alcunha Savarin após a morte de uma tia, que prometeu lhe deixar toda a sua fortuna sob a condição que adotasse o seu último nome.
Não é obra para quem quer matar a fome, literal ou de saber, mas para quem se delicia com petiscos fugazes, sente um prazer quase espiritual capaz de evocar o clima de uma época em que se preparava uma perna de vitela com três pombos velhos e vinte e cinco lagostins. É, enfim, para aqueles que acreditam que “o prazer da mesa pertence a todas as épocas, todas as condições, todos países e todos os dias”.
Brillat-Savarin Nasceu na cidade de Belley, na França, e dedicou-se nos primeiros anos da sua vida ao estudo do direito, química e medicina. Chegou a atuar como advogado, mas logo após a Revolução Francesa, foi eleito deputado constituinte, onde obteve certa fama, por um ou outro bate-boca com Robespierre, mas principalmente pela defesa firme das execuções públicas.
Foi autor de frases bem sacadas que estão por aí até hoje, seja no original ou em adaptações como “Diz-me o que comes, dir-te-ei quem és” ou “a descoberta de uma nova receita faz mais pela felicidade do gênero humano do que a de uma estrela”. Ele deixou livros sobre economia, política, direito e até um tratado sobre duelos. Ele morreu apenas dois meses após o lançamento de sua obra-prima e faria 267 anos neste sábado, 2 de abril. Bom motivo para um brinde especial.
Com informações da Folha de S Paulo