Carolina Rocha
Carnavalesco, rainha de bateria, mestre-sala e porta-bandeira… Até os menos familiarizados com os desfiles das escolas de samba são capazes de reconhecer essas funções nas agremiações que atravessam a Sapucaí. Mas, e o diretor de Carnaval? Quem são e o que fazem os responsáveis pelos “bastidores” do grande espetáculo? Como está no meme: Onde vivem? Do que se alimentam?
Na segunda-feira de Carnaval, o mundo conhecerá a história da principal referência no posto: Luiz Fernando Ribeiro do Carmo, o Laíla, enredo da Beija-Flor de Nilópolis. Ele transcendeu a função ao enxergar os desfiles com perspectiva holística, participando ativamente de todos os detalhes, desde a concepção artística até a apresentação do Sambódromo.
Foi pioneiro ao juntar sambas concorrentes; ao deslocar o casal de mestre-sala e porta-bandeira da bateria para a frente do abre-alas; ao coroar uma menina como rainha de bateria… Sua disciplina ao comandar a harmonia das escolas por onde passou lhe rendeu não apenas uma coleção de pioneirismos, mas o título de maior campeão do Carnaval. Ao todo, foram 28 campeonatos, sendo 22 no Rio de Janeiro.

“Ele vira a chave. O Laila trouxe inovações, formas de pensar e de trabalhar para o todo. No tempo que tenho de Carnaval, até hoje nunca vi ninguém igual. Ele é o único diretor que saiu do âmbito da sua escola para contribuir com todas as demais. Isso mostra, confirma e ratifica a expressão que é Laíla para nossa arte”, destaca Alex Fab, diretor de Carnaval da Viradouro.
Ele estreou com a vermelho e branco de Niterói no desfile de 2017, quando conquistou o vice-campeonato na Série Ouro. No ano seguinte, liderou a equipe até o título, garantindo o retorno ao Grupo Especial. Desde então, a agremiação coleciona resultados positivos: vice-campeonato em 2019, campeonato em 2020, terceira colocação em 2022, outro vice em 2023 e mais um primeiro lugar em 2024.
Fab atribui a qualidade de sua colaboração aos trabalhos fora da festa, como militar e na área de logística. “Certamente estas duas carreiras me deram experiências que consigo aplicar hoje no Carnaval. Durante minha formação, também entendi que a parte musical me levaria a um lugar de melhor entendimento para conversar com a direção musical, bateria e carro de som”, enumera ele, contando que estudou teoria musical. “Também achei necessário fazer algumas especializações em gestão de pessoas”, acrescenta Fab, que ainda acumula formações em segurança do trabalho, meio ambiente e gestão de qualidade.
O diretor de Carnaval é responsável por gerenciar o projeto da agremiação, conduzindo e dando suporte para a produção e logística de todas as ações antes e durante o desfile. Entre as atividades atribuídas, estão o planejamento da produção de alegorias e adereços, compra de material, disputa de samba-enredo, ensaios de quadra, ensaios de rua e condução da escola na Sapucaí.
“Ele participa desde o início do projeto até o desfile, sendo incluído em diversos processos, desde a parte financeira até a operacional. Entra no planejamento do enredo e só sai quando o último carro atravessa a Avenida”, explica Moisés Carvalho, diretor de Carnaval da Unidos de Vila Isabel. “Tudo o que o carnavalesco cria é responsabilidade do diretor de Carnaval gerenciar e viabilizar a produção. Por isso é muito importante que ele esteja alinhado com o carnavalesco para entender o que foi planejado, dizer o que é possível e buscar soluções para pôr o projeto em prática”, explica o diretor da azul e branco de Noel.
Não existe formação específica para exercer a profissão. Tal qual o autodidata Laíla, a maioria aprendeu “na raça”. É o caso de Moisés, que acumulou experiência nos 12 anos que passou na Porto da Pedra, escola da Série Ouro. “Foi lá que aprendi tudo que sei. Fui do financeiro ao administrativo. Fui secretário, comprador, empurrei carro…”, lista ele, lembrando dos tempos de escola pequena, com poucos profissionais disponíveis. “Acabei me envolvendo em todos os processos, principalmente no barracão. Chegava e pedia ao escultor: ‘Me ensina como é que faz isso?’ Não tive professor, fui de curioso”, recorda ele, dono de perfil discreto.
Entre os diretores, aliás, é comum a preferência por se manter longe dos holofotes. “A gente é backstage, é coxia, é estafe. Quem faz a escola campeã é o componente”, ensina Marcos Marino, atual diretor de Carnaval da Beija-Flor de Nilópolis, que começou na função em 2008, na Mocidade, e estreará em 2025 no cargo que Laíla ocupou por mais de 40 anos. “Para mim, [a Beija-Flor] será um desafio imenso, pois é a escola do meu mestre, que, por coincidência ou destino, é o enredo deste ano”.

Elogiado e recomendado por Laíla no passado, Marino faz questão de reforçar a importância do grande artista multicampeão. “Tudo a respeito do que é hoje um desfile de escola de samba passou pelas mãos do mestre Laíla. Hoje, todo e qualquer diretor se espelha no que ele fez. Particularmente, tenho gratidão enorme, pois ele ajudou muito na minha formação, me aconselhou e foi inspiração também”.
Ele assume sentir o peso da responsabilidade que carrega, mas está confiante na busca pelo título, que não vai para Nilópolis desde a saída de Laíla, em 2018. “Quando penso nisso [ocupar o mesmo lugar do ídolo] me assusto, por isso procuro trabalhar e focar no que é preciso para dar certo. Comandar a comunidade que ele formou é uma honra e uma grande responsabilidade, mas o sentimento que prevalece é da gratidão a todos que me abraçaram. A equipe lutará até o último segundo pela vitória. Sabemos que temos que trabalhar o dobro, o triplo, mas a equipe está ciente e confiante em fazer acontecer”, descreve, totalmente no espírito determinado e obsessivo dos colegas.