INCLUSÃO É ISTO: G20 SOCIAL TIROU O POVO PARA DANÇAR

O Presidente Lula durante sessão de encerramento do G20 Social

Luisa Prochnik

Em uma cidade em que a praia e a roda de samba, programas gratuitos e democráticos, reúnem pessoas de classes sociais, raças, raízes e gostos diferentes, pode-se afirmar que o G20 Social estreou no lugar certo. Evento paralelo ao G20, que reúne presidentes de 19 nações além de representantes da União Europeia e da União Africana, o G20 Social, espaço aberto para a sociedade civil e movimentos sociais, foi idealizado e concretizado pela primeira vez sob a presidência rotativa do Brasil, neste ano, tendo como sede a cidade maravilhosa. A escolha não podia ser melhor: a cidade mais cosmopolita do país.

– O Rio é a vitrine do Brasil. E temos muito orgulho de ser a cara do país para o mundo. A população, de um modo geral, ouve falar e não consegue participar. Aqui no Rio vai participar. Isso é o legado fundamental dessa presidência brasileira do G20, nas discussões da cúpula, das políticas que vão ser formuladas. Os líderes globais precisam ouvir o que o cidadão quer dizer – disse o prefeito da cidade do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, durante o discurso de abertura das conferências do G20 Social, realizada no Museu do Amanhã, no Centro da cidade.

Nos dias que antecederam os encontros entre líderes mundiais, cercados de pompa, circunstância e segurança, os Espaço Kobra, Armazém 2 e 3, Armazém Utopia e o Museu do Amanhã, cercados de povo, foram palcos de debates e mesas temáticas organizadas por movimentos sociais, grupos de engajamento, organismos internacionais, conselhos, universidades, governos, setor privado, dentre outros, do Brasil e do exterior, num total de 271 atividades.

Em uma delas, na mesa “Crescimento Inclusivo para um futuro Sustentável”, mediado pela Gerente de Projetos nas Forças-tarefas do G20 para Comércio e Investimento e Mulheres, Diversidade e Inclusão nos Negócios, Gabriela Leoni, os debatedores eram representantes da sociedade civil, da iniciativa privada, do setor público e de movimentos sociais. Carla Pinheiro, presidente do Conselho Firjan de Mulheres, falou na diferença entre diversidade e inclusão – “Diversidade é convidar todos para a festa e inclusão é quando convida para dançar”.  Assim como a proposta do G20 Social, quando todas as vozes devem ser ouvidas, não apenas as oficiais, as debatedoras pontuaram que olhar para todos não basta: os grupos minorizados precisam alçar esfera de poder e terem aumento de renda. E nem sempre essa prática deve ser pensada como algo fora dos domínios da empresa, por exemplo, mas pelo contrário:

– As empresas, na verdade, deveriam ter impacto em todas as suas esferas. Então, desde colaboradores, da cadeia produtiva, do olhar ambiental, do olhar social. Não é nada extra que a empresa precisa fazer, é na verdade transformar seu negócio em um negócio de impacto e garantir que a existência da empresa deva fazer bem para o mundo e para a sociedade – explica a líder de Direitos Humanos na Natura, Marina Leal.

 O G20 Social foi um evento que reuniu pessoas de referência em suas áreas e trouxe temas sérios e urgentes ao centro do debate. Mas, ao mesmo tempo, foi também uma grande festa, com encontros de línguas, sotaques, trajes típicos e, em comum, a vontade de tornar o mundo um lugar melhor. Os três dias dedicados ao G20 Social foram resumidos em um comunicado, entregue nas mãos do presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e endereçada ao presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, líder do país sede do G20 em 2025. 

O comunicado dá prioridade máxima e urgência à adesão de todos os países do G20 e de outros Estados à iniciativada Aliança Global contra a Fome e a Pobreza.

– São 733 milhões de pessoas que vão dormir toda noite sem ter o que comer. O mundo gastou no último ano US$ 2,4 trilhões em armamento e não gastou quase nada para dar comida para as pessoas – disse Lula, ao receber o comunicado, reforçando o alinhamento às sugestões do documento.

O texto do comunicado defende a soberania alimentar a partir da produção de alimentos saudáveis, o trabalho decente para superar pobreza e desigualdade, o combate a mudanças climáticas e uma transição energética justa, justiça fiscal – com a proposta de taxar progressivamente os super ricos -, combate à desinformação promovida pela extrema-direita e a reforma das instituições internacionais, como um novo modelo para o Conselho de Segurança da ONU, para que as mesmas reflitam a realidade geopolítica contemporânea.

O comunicado foi escrito por milhares de mãos, como resultado de centenas de encontros, de mesas temáticas e de diálogos promovidos por todo o Brasil ao longo do ano de 2024. Com centenas de debates, o Rio de Janeiro se tornou o centro do mundo, recebendo 47 mil pessoas criativas, potentes, proativas e interessadas em propor e em conhecer mais sobre ideias diversas por um mundo mais justo e igualitário. Pessoas também interessadas em fazer negócios e no espírito turístico e festivo do Rio de Janeiro.

– É uma alegria muito grande estar no Rio de Janeiro, eu acho que eu ainda não absorvi. Eu estou no centro do Rio de Janeiro vivendo essa experiência – disse Ulenice Casado, paraibana de Picuí, situada a 228 km da capital João Pessoa. Ulenice é pedagoga, nutricionista e viaja o país expondo produtos da sua terra.

– Eu fico muito alegre mesmo, transbordando, além de conhecer uma cidade dessas, que é maravilhosa, eu vim para as pessoas também conhecerem meus produtos: diretamente do Jalapão para o Rio – diz Patrícia Maria Rodrigues, do Quilombo Barra do Aroeira.

– Entre as mulheres, o extrativismo do Brasil inteiro está aqui, as mulheres do artesanato. A melhor coisa do Brasil está no G20 e nessa avenida maravilhosa.

Zeca Pagodinho se apresenta no palco do G20 Social na Praça Mauá

Ao longo do Boulevard Olímpico, foram organizadas feiras, com 180 barracas no total, em três caminhos temáticos: o da Sustentabilidade, o do Combate à fome e o da Cultura dos Povos. A Praça Mauá foi outro palco do G20 Social, onde aconteceu a Aliança Global Festival Contra a Fome e a Pobreza, três dias de show de artistas brasileiros. O festival, organizado pelo governo federal com ajuda da primeira-dama, Janja. a principal divulgadora do evento, foi inspirado em festivais internacionais como o “Live Aid” (1985) e o “Free Nelson Mandela Concert” (1988). (Movida pela empolgação de um discurso improvisado, Janja atacou o bilionário Elon Musk, o que virou polêmica nas redes sociais).

– Esses encontros assim só acontecem nesta cidade, que é a mais incrível de todas – disse o prefeito Eduardo Paes antes do início do evento – A Aliança Global contra a Fome e a Pobreza é uma celebração e é um grito de alerta, para chamar atenção para as vozes das pessoas que não recebem a devida atenção.

Alguns temas novos preponderaram em todos os debates: economia do cuidado, lacuna de confiança, racismo ambiental, transição energética justa, conversão de renda, justiça fiscal. Além, claro, de debater problemas já bem conhecidos, como precarização do trabalho, desigualdade social e de gênero, diversidade e inclusão, fome.

Múltiplas vozes, milhares de debates e encontros. A pedra fundamental foi lançada, problemas mapeados e soluções propostas: o G20 Social já é uma realidade.