Ricardo Bruno
A 100 quilômetros do Rio, em direção à serra fluminense, descortina-se uma região de características singulares – absolutamente inusitadas, para a maioria dos cariocas e fluminenses. Neste terreno pouco conhecido, de temperaturas amenas e frequentado ainda quase só por iniciados, assiste-se prazerosamente ao nascimento de hábitos e costumes incomuns em nossas plagas. Do topo da montanha, vê-se o florescer de videiras frondosas que remetem à Toscana e se adquire certeza de que a pequena Areal, antigo distrito de Três Rios, se transforma célere no mais novo terroir nacional.
Para se compreender a transformação cultural e econômica da região, antes é necessário entender o conceito. De origem francesa, a palavra não tem tradução em outros idiomas. Numa versão rasa, seria território ou terra. Mas terroir é muito mais, abarca outros sentidos. Com o termo, os franceses tentaram exprimir o que seria o senso de origem, o conjunto de características – solo, textura, mão de obra e técnica de cultivo – que emprestam personalidade ao vinho de uma região.
Areal possui hoje mais de 30 hectares de área plantada, o que permite uma estimativa de produção média de 60 mil garrafas de vinho por ano. Já são 12 vinícolas em formação e mais de 100 mil pés de uva: Cabernet Sauvignon, Merlot, Shiraz, Sauvignon Blanc, Niágara Rosa, Malbec, Tempranillo, Sangiovese e Montepulciano.
Coube ao competente Jan Theophilo, a tarefa de explorar a região em reportagem de texto leve e instigante. Com a matéria, a Rio Já cumpre uma de suas atribuições centrais: desvelar as inovações culturais e econômicas de um estado em permanente transformação. Em síntese, ajudar o Rio a conhecer o Rio. (Para ler a reportagem, clique neste link).
Casos como o de Areal merecem o reconhecimento público do papel estratégico dos agentes políticos no desenvolvimento de municípios e regiões. O que está acontecendo lá deve ser, em boa medida, creditado ao empenho e ao esforço do prefeito José Augusto Bernardes, o Gutinho. Encravado entre os encantos naturais de Petrópolis e a industrializada Três Rios, Areal não tinha uma vocação econômica definida. Com a ajuda de uns poucos empreendedores locais, Gutinho conseguiu em alguns anos transformá-la na capital fluminense da uva.
Hoje, há uma charmosa efervescência econômica naquela região, em torno da produção de uvas, com a importação de sofisticadas técnicas europeias, que já atraiu empresários como Rubem Medina, da Artplan; Sávio Neves, atual secretário estadual de Turismo; Chiquinho Brandão, dono da FSB, a maior agência de comunicação da América Latina, e José Auriemo Neto, presidente do Conselho de Administração da JHSF, conglomerado empresarial que reúne do Shopping Cidade Jardim ao Hotel Fasano em São Paulo.
Nesta edição, a Rio Já mergulhou ainda no imbróglio do Galeão com o propósito de destrinchar as razões que levaram o terminal, outrora o mais importante do país, ao completo esvaziamento. Aydano Motta esteve nos dois aeroportos e relata, com percepção aguçada, números precisos e texto magistral, o contraste entre a superlotação e o abandono. (Para ler a reportagem, clique neste link).
O paradoxo dos aeroportos do Rio é também resultado de políticas públicas – neste caso, desastrosas. Após a concessão em 2013, o Galeão passou a ser continuamente esvaziado em favor do Santos Dumont. Os burocratas da Infraero, em conluio pernicioso com as companhias aéreas, transferiram a maioria dos slots das voadoras para o terminal do Centro, sob a alegação de que esta é a demanda natural dos passageiros. Abdicaram do papel regulador de toda estatal para se renderem exclusivamente à lógica de mercado. Sabe-se lá com que interesse…
Há espertezas criminosas no processo. Reparem a falta de escrúpulo dos agentes públicos historicamente envolvidos. Em 2013, privatizaram o Galeão com ágio espetacular de 390% e, na sequência, passaram a esvaziá-lo, numa ação predatória inaceitável. Ou seja, ainda que os responsáveis tenham mudado, o agente público do Estado brasileiro, seja quem for, atuou de modo contraditório e danoso nas duas pontas. Primeiro, age supostamente para fortalecer o terminal; depois cuida de inviabilizá-lo – contra os interesses do Rio e do Brasil.
Sem falar nas razões menores da Infraero. O Santos Dumont é único aeroporto integralmente gerido pela estatal. Aumentar seu movimento significa automaticamente elevar o faturamento da empresa. A crise dos aeroportos, pois, resulta da irresponsabilidade de gestão do setor público associada a má-fé de empresários inescrupulosos. Atuam sempre em favor de objetivos inconfessáveis, contra qualquer princípio republicano. Essa combinação de agentes públicos venais e homens de negócios vorazes é sempre muito deletéria. O Galeão de hoje, sucateado, está aí a provar.