Ricardo Bruno
O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro é um mundo, levando-se em conta os milhares de problemas humanos com que lida todos os dias, e uma cidade, se for considerado o tamanho de sua estrutura e de suas necessidadeS práticas.
O “mundo” é atendido por 190 desembargadores e quase 700 juízes – muito pouco para a demanda da sociedade.
A “cidade” precisa manter funcionando um lugar em que trabalham 12 mil pessoas, onde tramitam no momento cerca de 8 milhões de processos e no qual é imperativo aplicar novos métodos e modernidade administrativa.
Estas informações dão uma ideia, ainda que pálida, da tarefa hercúlea do presidente do TJ-RJ, o desembargador Ricardo Cardoso.
Se não lhe falta trabalho, sobram-lhe ideias e esforço para encontrar soluções cujo objetivo, fundamentalmente, é fazer a corte funcionar da melhor e mais atualizada maneira possível.
Magistrado há 34 anos, Ricardo Cardoso foi recebido por Ricardo Bruno, no programa “Jogo do Poder”, para contar o que tem feito para modernizar o Tribunal de Justiça que está entre um dos cinco maiores do mundo. Em apenas seis meses na função, ele adotou como uma de suas prioridades a atualização tecnológica e o investimento em sustentabilidade e boas práticas.
– O nosso sistema de informatização ainda não é o mais prático para um tribunal de tal dimensão, embora possa ser suficiente para tribunais menores. Mas estamos treinando servidores para melhorar isto – ele afirma.
– Tenho adotado uma bandeira centrada numa governança moderna, reestruturação da área tecnológica e num projeto em que o tribunal se envolva com a sustentabilidade e responsabilidade social. Estes são os três pilares que eu apresentei como ‘programa de governo’ – explica.
O desembargador explica as dificuldades recentes, que o antecederam: – O Estado do Rio viveu uma crise política, que resultou no afastamento de vários governadores. Houve também uma crise econômica foi muito acentuada. O estado praticamente faliu e aquilo repercutiu sobre o Judiciário. Depois veio a pandemia e foram dois anos de paralisação. Agora, embora estejamos sob uma recuperação fiscal, assumo sem aqueles problemas. Pelo menos se volta a respirar. A sociedade volta a andar e a viver. E todos corremos contra o tempo.
RIO JÁ: No que diz respeito à sustentabilidade e compliance, que medidas o senhor já tomou?
RICARDO CARDOSO: Assim que assumi, consegui aprovar uma reforma administativa. Criei uma secretaria especial de governança, compliance e inovação. Adoto os princípios mais modernos de governança, criei um laboratório de ideias e estou investindo agora num código de ética para todo o Judiciário.
O nosso parque tecnológico estava muito debilitado. Estou propondo uma renovação total. Estamos adquirindo uma ‘nuvem’ privada para armazenar informações. Estamos trocando nosso equipamento e até o final do ano teremos 10 mil novos computadores, vamos distribuir e vamos adquirir mais dez mil no ano que vem. Melhoramos a remuneração dos técnicos em informática.
RIO JÁ: Por que criar um código de ética, se já existe um código de ética de magistratura?
RICARDO CARDOSO: O que não existia é um código de ética para os servidores do Judiciário. Foi o que criei quando fui corregedor na gestão passada para os que estavam na alçada da corregedoria. Agora estou criando o código de ética para todos os servidores. Isso é importante. Os servidores precisam entender as boas práticas, a ética no serviço público, aquilo que eles podem e o que não podem fazer, aquilo que hoje a sociedade quer para ela como princípio ético.
RIO JÁ: Este processo de modernização tecnológica leva obrigatoriamente à questão da Inteligência Artificial e, eventualmente, ao seu uso como auxiliar e para apressar e acelerar os julgamentos?
RICARDO CARDOSO: Já me perguntaram se a Inteligência Artificial poderá substituir o juiz. Absolutamente não. O juiz nunca vai deixar de existir. O que está no meu programa, e preciso entrar nisso o mais rápido possível, é considerar que a IA veio para facilitar o trabalho do juiz. Há julgamentos que são repetitivos, apoiam-se em teses de direito consagradas. A IA pode fazer o impulso processual, como citar e chamar o réu, por exemplo. Mas o juiz é insubstituível porque em certos momentos, em certas ações, é necessário ter sensibilidade no julgamento. O julgador precisa olhar nos olhos de quem está julgando. Isto a IA não tem. Na área de família, outro exemplo, as decisões que a gente toma nem sempre passam apenas pela lei.
RIO JÁ: O cidadão comum, o cidadão mais humilde, por vezes tem medo de buscar a Justiça. Quais são as ações do TJ-RJ para mudar isso e tornar o Judiciário mais acessível a todos?
RICARDO CARDOSO: Esta é uma das minhas grandes preocupações. O cidadão tem que saber que ele pode contar com a Justiça. Nós, magistrados, temos que saber que não estamos aqui fazendo favor. Nós recebemos uma remuneração para prestar um bom serviço. O tribunal oferece sentenças – o que chamamos de prestação jurisdicional. Este é o produto que oferecemos. E o acesso a ela tem que ser facilitado. Além disso, temos que ser entendidos pelo usuário. Um exemplo é o linguajar. Aquilo que parece entre nós muito fácil, muitas vezes o usuário não entende. O leigo muitas vezes não sabe o que é uma jurisprudência,o que é um acórdão. Nós criamos um manual de linguagem simples, está no nosso site para que todos entendam. Tem um glossário de expressões.
RIO JÁ: Que medidas o TJ tem tomado quanto à questão da sustentabilidade:
RICARDO CARDOSO: Nós temos 12 mil servidores, mais os magistrados, Já foram 17 mil e houve uma redução grande e, provavelmente, com a digitalização dos processos, vai reduzir mais. Eu criei a secretaria geral de responsabilidade social e sustentabilidade. Estamos mostrando que o tribunal está comprometido com isto. Firmamos uma parceria com a UERJ, para que ela nos oriente sobre o tratamento de resíduos sólidos que o tribunal produz. Estamos investindo em terraços verdes. Uma das fachadas do tribunal será toda verde. Já pedimos ajuda ao prefeito para que em uma das laterais do tribunal seja criada uma grande praça, onde hoje há um imenso estacionamento. Todos os nossos telhados estão recebendo placas fotovoltáicas, e teremos isto em nossas dependências no estado inteiro. Nós, do Judiciário, temos que mostrar que, tal qual uma empresa moderna, também estamos comprometidos com a trilha da responsabildade social e da sustentabilidade.