CIDADE: UMA ACADEMIA DE CINEMA NA ROCINHA

Atualmente, a Academia de Cinema da Rocinha está em busca de parcerias

Luisa Prochnik

Comunidade, bairro, favela, um mundo inteiro. Essa é a Rocinha, local conhecido por brasileiros e turistas. Conhecido? Segundo moradores, muito pouco conhecido.

Afinal, quem narra para o mundo boa parte do que se sabe sobre a Rocinha não mora por lá. Mas tem gente boa querendo mudar o rumo dessa prosa desde o fim do ano passado com a inauguração da Academia de Cinema da Rocinha. O primeiro passo tem sido a exibição de filmes locais e comerciais, fomentando o debate entre público e profissionais do meio, e cursos gratuitos de férias, quando questionários são distribuídos aos alunos para que eles informem suas demandas e expectativas. Tudo para preparar o terreno para a próxima e ambiciosa etapa: oferecer gratuitamente cursos de formação e profissionalização tanto para quem quiser começar quanto para quem já produz conteúdo conquistar, de vez, seu espaço no mercado do audiovisual.

– Sempre que vinha qualquer curso para a comunidade era de forma mais rasa. A gente quebra esse paradigma. Vamos entregar material potente. Se é para ensinar, é para ensinar para valer, do jeito que está sendo lá fora, com qualidade – diz Marquinhos, o idealizador da escola de cinema.

Marcos Braz, o Marquinhos, é aquele que se pode chamar de sonhador e realizador.

– A nossa casa na favela é tão pequena, mas, ao mesmo tempo que ela te esmaga, ela te abre para um mundo que é gigante. A gente dá solução para muitas coisas ali por conta da escassez. Desde soluções criativas como projetos de filme, até coisas do dia a dia, como economizar água, economizar luz – reflete Marquinhos.

Marquinhos tem parceria com Michelle, sua esposa. Há dez anos, criaram a 2Base, produtora audiovisual com muito conteúdo de videoclipes e documentários. Já a vontade de compartilhar conhecimento ganhou força ano passado quando, apoiado por Michelle, Marquinhos levou a ideia da escola de cinema para uma incubadora local e foi selecionado. E como no audiovisual nada se faz sozinho, boas companhias se juntaram ao casal para formar sociedade. Uma delas é Dani Castro, jornalista e produtora com longa experiência em escola de cinema. Juntos, eles conseguiram que a estreia da Academia fosse em grande estilo com exibição do longa-metragem ‘Nosso Sonho’, que conta a história dos funkeiros Claudinho e Buchecha.

– Um filme que fala sobre comunidade sem violência, onde é o sonho de dois jovens que são amigos. E a vida deles é completamente transformada através da arte, da música. E isso tocou, teve um menino que chorou muito. (…) A gente tem o cuidado de escolher os filmes. Todos têm que ser nacionais e têm que ter alguém da equipe para falar com a galera, até para desmitificar essa coisa do audiovisual, mostrar que é uma galera que corre muito atrás – relembra Dani.

Essa dificuldade de ingressar no mercado do cinema, ainda mais para quem vive em comunidade, é o grande obstáculo a ser vencido. Diante desse cenário, Paola Vieira, com muitos anos de experiência, foi convidada a compartilhar seu conhecimento no curso ‘Elaboração de Projetos’.

– Eu tentei dar uma pincelada desde como surge uma ideia, como ela se desenvolve, etapas do projeto, equipe. E como monetizar também. Falar do mercado, do que existe, para as pessoas não ficarem achando que o fim dos projetos tem que ser botar de graça no Youtube – relata Paula.

– Sempre que vinha qualquer curso para a comunidade era de forma mais rasa. A gente quebra esse paradigma. Vamos entregar material potente. Se é para ensinar, é para ensinar para valer, do jeito que está sendo lá fora, com qualidade – diz Marquinhos, o idealizador da escola de cinema.

Exatamente essa é a situação que acontece com Hudson Carvalho, o Babão, ator e produtor local, que, desde 2015, se divide entre a serralheria da família e a produtora RocyWood, uma mistura da Rocinha com Hollywood. Dos filmes que produziu e/ou participou como ator, muitos estão de graça na plataforma de vídeos. Por isso, para organizar projetos para editais e vendas, ele se inscreveu na Academia de Cinema da Rocinha. Outra aluna, Sara Badaro, atriz e escritora de poemas, tem ideias de sobra, argumentos já escritos, que vão de desenho animado a filmes e séries, muitos contando as histórias da Rocinha de dentro.

– Eu fui me inspirando para fazer essa ficção, juntar toda questão da Rocinha, que eu não acho legal, que eu não posso mudar, e ir colocando a ficção na realidade – revela Sara.

Atualmente, a Academia de Cinema da Rocinha está em busca de parcerias e fonte de renda. Por enquanto, é tudo “no amor”, como os sócios mesmo dizem, e as aulas e exibição dividem-se em duas salas no CRAS Rinaldo de Lamare, Centro de Referência de Assistência Social, que fica do outro lado da rua, ou seja, fora da comunidade. Mas a ideia é se mudar para dentro da Rocinha e, de dentro, se comunicar com o mundo.