CASA HORTO: JARDIM DAS DELÍCIAS

P'Alma, no segundo andar: bar com alta coquetelaria

Bruno Agostini

Quando chegamos à Casa Horto, no Jardim Botânico, recebemos as boas-vindas de ninguém menos do que O Cristo Redentor, que lá do alto, iluminado, é a cereja no bolo do cenário desta novidade que já nasceu fazendo sucesso. O espaço, com 1.300 metros quadrados e dois andares, com capacidade para mais de 200 pessoas, está agitando ainda mais este bairro que é uma extensão do Jardim Botânico, uma área que desde o ano passado ganhou vários novos endereços relevantes, chamando a atenção de cariocas e turistas, tanto do ponto de vista da gastronomia quanto da badalação noturna.

A arquitetura, com assinatura de João Uchôa e interior desenhado por Vanessa Borges, pode ser classificada de suntuosa, e de muito bom gosto. A decoração soube explorar o prédio histórico de quase 200 anos, que tem móveis bem brasileiros, incluindo autores como Sergio Rodrigues, que se representa através de sua icônica poltrona mole. Assim como também valorizou o entorno: estamos dentro da casa, como se estivéssemos ao ar livre.

As paredes foram erguidas em 1839, ano de construção do sobrado histórico, mas as obras ainda não acabaram. O espaço ainda vai ganhar dois novos ambientes: o Speakyeasy, o bar “secreto”, com drinques que prometem ousadia, e seleção musical criteriosa; e o Empório 1839, um armazém com seleção cuidadosa de produtos e pratos ligeiros.

Logo na primeira semana de funcionamento já começou a ficar cheio, como constatamos numa noite de quinta, com os dois espaços lotados, de modo que ainda é muito recomendável fazer reserva. Havia um clima de festa no ar, com um público variado, que ia de grupos de jovens a pessoas mais velhas. A razão disso tudo, além da beleza do espaço, está no time de profissionais envolvidos.

No andar de baixo funciona o Pátio, uma casa de carnes de inspiração argentina, que tem no comando da vistosa parrilla o chef “hermano” Adair Herrera, que ficou anos à frente do Tragga, onde mostrou aos cariocas seu talento no preparo de carnes e de pescados.

Empanadas de fraldinha no Pátio

– O que estou procurando hoje no Pátio é uma experiência de qualidade, trazendo produtos como legumes e até folhas, além de proteínas, ao conceito de grelhados, dando um defumado e selado marcante para trazer uma sensação diferente ao cliente. Produtos selecionados são essenciais, os melhores possíveis, criando qualidade e padronização para o comensal. O meu desejo é fazer com que o cliente volte e experimente a mesma gastronomia, com a mesma qualidade do primeiro dia que veio – diz Adair Herrera.

Entre as boas pedidas estão o pão de queijo e as empanadas, de carne e de cordeiro, bem como o carpaccio. Da parrilla saem cortes como fraldinha, T-bone e bife ancho, entre outros, além de crustáceos e peixes. Como guarnições, há palmito fresco assado na parrilla na própria casca, creme de espinafre e outros clássicos do gênero, como farofa e fritas.

No segundo andar há uma operação completamente distinta, que só abre de noite, mesmo nos fins de semana, pelo menos por enquanto. É o P’Alma, batizado em homenagem às palmeiras imperiais que podemos observar do salão, trazidas para o Brasil por Dom João VI, no início do século 19, ainda antes da construção do prédio.

Ali, um quarteto de mulheres dá as cartas. Na cozinha, a chef Luisa Veiga cuida da cozinha, com ajuda da pâtissier Tamara Wilson, a responsável pelas sobremesas, como a pavlova com doce de leite e frutas vermelhas, a mud Pie com sorvete de creme e a tarte tatin com sorvete de canela. No universo etílico, o bar tem no comando a premiada Jessica Sanchez, que criou uma carta de drinques bem autoral, de olho nas tendências globais.

– Conseguimos uma série de garrafas bem especiais e raras, de destilados, bitters etc, algumas antigas, e outras que sequer são importadas para o Brasil. Assim como produtos nacionais bem especiais, como o Abadia San Basile, um licor de ervas que tenta reproduzir, com notável sucesso, o francês Chartreuse, feitos por monges, receita secreta – comenta Jessica Sanches.

Já a carta de vinhos foi feita pela sommelière Elaine de Oliveira, que também fez a seleção do Pátio e do Empório.

– Eu busco uma experiência para as pessoas. Todo prato que crio, quero que as pessoas tenham uma experiência, assim, de entender como cheguei naquele prato. Tem que ter um sabor, um equilíbrio do doce, do azedo, do salgado. Eu penso na apresentação. Eu brinquei outro dia que eu postei uma frase, que cozinhar é uma forma de amar os outros, né? E pra mim, cozinha é isso. É eu distribuir amor, assim, afeto, sabe? Teve um cliente que falou isso: “Luisa, cada garfada da sua comida, eu sinto amor, carinho, afeto” E eu quero só distribuir esse amor, por aí – conta Luisa Veiga.

Foie gras com abóbora: chef Luisa Veiga

Seu cardápio tem receitas de referência, como steak tartare, e uma viciante porção de chips de aipim com trufas. Entre as melhores pedidas estão, ainda, o foie gras poêlée com espuma de abóbora, além de um arroz meloso de frutos do mar.

– Pensei em algo que mescle pequenos produtores e grandes produtores. Eu gosto de vinhos naturais, orgânicos, biodinâmicos, mas também gosto de vinhos tradicionais. Eu digo que é uma carta democrática, tem para todos os estilos e gostos, tem para todos os bolsos. Porque o vinho mais barato da carta custa R$ 98, até um Champanhe, que custa R$ 9.700. A palavra é democrática. No geral, os produtores são todos sustentáveis, tem uma responsabilidade, um compromisso com isso. Acho extremamente importante hoje em dia. São 90 rótulos no total. Tem uma parte só de vinhos laranjas, um estilo que eu gosto bastante – comenta Elaine de Oliveira.

No espaço, um pequeno palco vai receber shows, com artistas como Leo Jaime, que já está preparando a sua playlist, com clássicos do rock, ainda sem data para começar. Assim como ainda não há previsão exata da inauguração do Empório 1839, um armazém com cardápio de comidas ligeiras, com saladas, sanduíches e pratos leves, com venda de produtos variados, de pães a cafés, passando por vinhos, queijos e itens gastronômicos cuidadosamente selecionados, e do Speakyeasy.

O que já é bom e badalado promete ficar ainda melhor e diversificado. A Casa Horto é um pequeno universo.

‘RIO JÁ’ ANTECIPOU A TENDÊNCIA

A inauguração da Casa Horto revela uma tendência que apontamos no ano passado, quando abriu as portas o não menos suntuoso Elena, logo ao lado, na mesma rua Pacheco Leão, e a Casa 201, na Lopes Quintas, que rapidamente entrou para a lista de melhores restaurantes do Rio. O Jardim Botânico tem tradição na gastronomia carioca há tempos, mas a área nos arredores da sede da TV Globo ganhou várias novas casas do ano passado para cá, se somando a outros endereços como o italiano Grado; o Sud O Pássaro Verde, de Roberta Sudbrack; a padaria La Bicyclette; a Ella Pizzaria; e o Escama, restaurante especializado em pescados.

Abriram as portas, em sequência desde 2023, lugares de referência, como a confeitaria Absurda, onde encontramos algumas das melhores sobremesas da cidade; o asiático descolado Katz-Su; o português açoriano Quinta da Henriqueta; e a dupla Elena e Eleninha, dos mesmos sócios, que aposta na fusão dos sabores asiáticos com a alta coquetalaria. É o Jardim Botânico, cada vez mais saboroso.

Link para a matéria, publicada na edição de junho de 2023: