Por Washington Quaquá
Winston Churchill, o primeiro-ministro conservador inglês, herói da resistência ao nazismo, ao lado de Stálin e Roosevelt, disse que: “A democracia é o pior dos regimes políticos, mas não há nenhum sistema melhor que ela”. Na verdade, fora da arte, há pouca coisa da construção humana que não tenha defeitos razoáveis, e quanto mais coletiva é a empreitada, mais defeitos tende a ter. Mas são justamente esses defeitos suas maiores virtudes, pois somos seres dotados de inteligência e individualidade e a média tende sempre a uniformizar padrões, desagradando uma parcela do todo. Mas, pelo menos, o desejo e os interesses das maiorias podem ser ouvidos e atendidos na arena da democracia.
Surgida na humanidade, de fato, com a luta contra o autoritarismo do estado absolutista, embora inspirada na filosofia e na prática grega clássica da Antiguidade, que era assentada sobre a escravidão e praticada apenas pela elite econômica e socialmente minoritária, na modernidade, em seu renascimento no iluminismo oitocentista, a democracia, forjada na filosofia que brotou da aliança das classes populares com a burguesia, em oposição a nobreza e estado absolutista, foi equipada com instrumentos de preservação também dos interesses das minorias.
O modelo liberal clássico da democracia, com a instituição do voto universal; da separação entre os poderes independentes mas harmônicos, com seus pesos e contrapesos, com o objetivo de evitar a hipertrofia de um sobre outro; da preservação de direitos e garantias individuais, como a inviolabilidade dos lares, dos dados e informações pessoais, do direito à privacidade e à opinião; do direito à propriedade para todos e sem monopólio; do direito à justiça e a um julgamento justo, com a presunção da inocência e com o amplo direito a defesa, tendo a privação de liberdade como recurso ultimo e excepcional; etc…
Todos estes princípios consagrados pelas revoluções inglesa, francesa e americana, e aprofundados pela social-democracia com a acoplamento do Walfare State, o estado de bem estar social, nos países desenvolvidos, garantindo emprego, aposentadoria, melhores salários e melhores condições de vida para as classes trabalhadoras, constituíram um imenso avanço para a humanidade.
Mas com o extraordinário avanço cientifico e tecnológico dos anos 80 e 90 do século XX, e o consequente aumento da produtividade da economia, ao invés da humanidade avançar no caminho de novas formas de organização societária, o que se viu foi um imenso retrocesso.
Primeiro, as grandes corporações financeiras sequestraram e monopolizaram a economia, a cultura, as sociedades e o sistema político.
Mais recentemente, estas mesmas corporações passaram a controlar grandes empresas de tecnologia da informação e suas redes sociais passaram a sequestrar as mentes, a opinião e, por fim, a democracia, já combalida pelo domínio das finanças e do capital sobre ela.
Sob a ideologia do combate ao terrorismo, potencializada com os ataques de 11 de setembro sobre os EUA, se corroeu a liberdade. Todo um modelo de controle sobre as liberdades individuais foi instituído globalmente, reforçando a xenofobia e se instituindo um estado policial.
Houve uma hipertrofia do judiciário e uma crescente criminalização do espaço público e da política, associada à sua mercantilização e desmoralização.
Esse ano o Brasil tem eleições para Presidente da República, para o Congresso Nacional, para governadores e para as assembleias estaduais. Depois de 6 anos de desastre, é a oportunidade que temos de investirmos nossos esforços cívicos para recompor a democracia brasileira. Refazer o pacto político e social estabelecido no fim da ditadura, expresso no espirito, nos princípios e nos artigos da Constituição de 1988. Enterrar os esqueletos autoritários da casa grande e dos quartéis e promover um amplo pacto social e de fortalecimento da democracia. Esse é o melhor investimento para o Brasil.
*Washington Quaquá é cientista social e um dos editores da RIO JÁ