Bruno Agostini
Ainda podemos falar de 2024? No ano passado o Rio de Janeiro foi palco de importantes eventos gastronômicos de repercussão mundial, como o lançamento do Guia Michelin, que premiou alguns restaurantes cariocas com as suas cobiçadas estrelas (Oro, Oteque e Lasai conquistaram duas; enquanto Mee, Cipriani e San Omakasê Room ficaram com uma). De janeiro a dezembro a cidade e seus arredores viram nascer muitos novos restaurantes, com várias inaugurações que foram marcantes para mim, todos eles destacados nesta revista e site ‘Rio Já’.
A primeira delas abriu as portas no dia 5 de janeiro, na localidade de Secretário, em Petrópolis, que se consolida como um importante polo gastronômico e de turismo rural. O Catarina Bar e Bistrô é um espaço dos mais agradáveis, cuidado com carinho pelo casal Raphael Renaldin, que cuida das bebidas, e Catarina von Seehausen, responsável pela cozinha. Às sextas a casa convida a preguiçosas refeições, como nos almoços de sexta, com comida caseira preparada no fogão a lenha. O menu está sempre mudando, vez ou outra apresentando iguarias importadas, como as incríveis anchoas del Cantábrico, vindas da Espanha, e trufas italianas, que são importadas diretamente por Renaldin. Espere encontrar pratos aconchegantes, como guioza de rabada e rosbife tonnato, além de drinques de alto nível, com destaque para os clarifocados, tipo “milk punch”, que estão em alta em todo o mundo. A carta de vinhos é focada nos rótulos nacionais.
No início de janeiro, exatamente no dia 6, abriu as portas o Suru Bar, balançando a Glória, reforçando a ideia de que este é o bairro do momento no Rio – até a praia que por anos esteve imprópria para banho hoje tem ficado cheia, com águas claras onde pode até se ver tartarugas-marinhas. A dupla de bartenders Igor Renovato e Raí Mendes propõe o que chamam de coquetelaria popular brasileira, criando drinques com preços bem interessantes, que atraem um público jovem, que lota o salão e a calçada, ao som de uma trilha sonora que tem muito samba e suingue. O cardápio traz petiscos bem bolados, como o pão de queijo frito, o bolo de carne à parmegiana e o torresmo da casa, além de pratos como o cupim ao molho com maionese de batata e o talharim fresco com almôndegas ao pomodoro e queijo Canastra. O sucesso foi tanto que em novembro eles atravessaram a rua, inaugurando o Suru Bafo, especializado em carnes assadas lentamente nas churrasqueiras a bafo, como ossobuco e copa-lombo, com guarnições como arroz à piamontese, arroz verde de brócolis, farofa de ovos, salada fresca de tomate e palmito. Sucesso total e imediato.
No fim de janeiro, outro marco, a meu ver: abre as portas o Koral, em Ipanema, apresentando uma cozinha criativa, que deu projeção ao jovem chef Pedro Coronha, com muitos pratos que passam pela churrasqueira, como o namorado na brasa e o ancho ao chimichurri. De enxuto e certeiro menu, dois pratos especialmente fizeram a minha cabeça: o sanduíche de frango frito com unagui (a enguia japonesa), com molho tártaro e picles; e a salada Caesar de cavaquinha – que tem o crustáceo e folhas verdes tostadas na churrasqueira. O ice cream sandwich combina deliciosamente cremeaux de chocolate, sablé de cacau, frangipane e sorvete de pistache.
Em março foi a vez da gigante Nolita Roastery, no New York City Center, na Barra, a mais nova empreitada do empresário Marcelo Torres, do Grupo Best Fork (Giuseppe Grill, Yusha e Xian, entre outras operações). No total, são impressionantes 520 lugares: 400 no restaurante e 120 no café. O menu tem alguns pratos tamanho família, que são finalizados à mesa, para muitos, caso da Caesar salad e do steak tartare. Um dos destaques do cardápio são as chamadas “Paneladas”, que podem ser servidas em porção individual, ou para muitos, como o Oyster & Shrimp Rice (arroz branco com ostras e camarões VM), a moqueca de peixe à moda Baiana (com peixe branco do dia, servida com arroz branco e farofa de dendê), 0 bobó de camarão, o arroz de pato e a costela braseada por oito horas. Há, ainda, flatbreads, mas também pizzas, sanduíches e uma boa seleção de saladas, além de pratos de massas e uma variada seção de petiscos.
Em maio foi a vez do Ristorantino, famoso italiano de São Paulo, que abriu as portas no Village Mall, também na Barra. O cardápio transita entre pratos mediterrâneos, com mais leveza e frescor, e a cozinha mais robusta, do norte da Itália. Então, encontramos desde a famosa e fotogênica lasagna al tartufo nero, marca registrada da casa, até carpaccio de polvo com palmito em brunoise. O cabrito assado tem ponto de cozimento perfeito, e um molho que se casa perfeitamente com a delicadeza da massa cabelinho de anjo.
No final de maio subimos a serra novamente, em direção ao Fuego Marambaia, casa de carnes de perfil rústico, que fica na entrada da luxuosa Casa Marambaia, na localidade de Corrêas, em Petrópolis. Escrevi assim, na reportagem que virou capa na edição de junho da Rio Já: “No salão bem iluminado pela luz natural, todos os olhos se voltam para o braseiro, elemento principal da cozinha, com um varal onde assam legumes, cogumelos, frutas e carnes de longo cozimento, como a costela e cupim. Ao lado, uma parrilla tem fogo altíssimo, onde são grelhados cortes como tomahawk, Denver steak e bife ancho, entre outros. O forno iglu a lenha também chama a atenção, e de lá saem deliciosos pães de alho e fondutas de queijo, por exemplo. Ao redor, o verde da Mata Atlântica serve de cenário, reforçando o clima campestre, no melhor estilo rústico-chique”.
Ainda em maio, na esteira do sucesso do Meio-Dia, na rua Real Grandeza – inaugurado em novembro de 2023 – abriu as portas o Meia-Noite, na rua Fernandes Guimarães, epicentro do burburinho jovial de Botafogo. Entre dezembro e meados de janeiro o chef Fred Motta esteve no Japão, buscando inspiração para as suas casas. Ele adianta que, no Meia-Noite, vai apostar no conceito de yakitori-ya (restaurante de yakitori), com seus espetinhos de polvo, frango e outras ideias que ele está trazendo na bagagem.
Em agosto, mais duas novidades: em Botafogo abriu as portas a Casa TLTP, que tem nos vinhos naturais brasileiros servidos diretamente das torneiras a sua razão principal de ser. Fruto da parceria entre os sócios do Sult, a poucos passos dali, na mesma rua Fernandes Guimarães, e do Sebástian Gastrobar, na Gávea, com a sommelière Gabriela Montaleone e o distribuidor de vinhos Ariel Kogan, o espaço também tem vinhos importados e nacionais em garrafas, além de vermutes artesanais da Companhia dos Fermentados. Para comer, uma seleção de queijos e charcutaria de alta qualidade, além de conservas de pescados do Projeto A.Mar, que trabalha com pequenos pescadores de comunidades tradicionais do litoral de São Paulo. (A casa reforçou uma tendência: os bares de vinhos naturais. Em outubro, quase que simultaneamente, abriram as portas o Libô, em Botafogo, e o Virtuoso, em Ipanema, com a mesma proposta de servir vinhos com baixa intervenção).
No mesmo mês de agosto, sem fazer muito barulho, o chef Mateus Zanchini desembarcou de São Paulo no Pope Ipanema, que renovou o seu cardápio com uma pegada criativa, a mesma que ele implementou no Borgo Mooca, na capital paulista. Entre os destaques, há entradas como as lulinhas “no purgatório” em salsa de tomate picante, com ovo caipira e pão da casa; e a dupla de arancini milanês de camarão, com açafrão, grana padano e maionese de bottarga. Para os pratos principais, os louros vão para a lasanha de ossobuco, com fonduta de grana padano e molho rôti; e o clássico beef Wellington de mignon, com duxelles de cogumelos, presunto cru e crespelle de espinafre na massa folhada, acompanhado de aligot, vagem francesa e molho rôti. Pena que a mudança implicou no fim das pizzas (pelo menos, a alicceta permaneceu: trata-se de deliciosa pizzetta com pomodoro, fior di latte, grana padano e alici italiano).
No mês de setembro, outro destaque da temporada 2024: a Casa Horto é mais um espaço grandioso, nesta área emergente na cena gastronômica carioca, com distintas operações. No primeiro andar está o Pátio, com parrilla e menu do chef argentino Adair Herrera, que está servindo ali algumas das melhores empanadas e carnes da cidade. No segundo andar, com vista para o Cristo Redentor está o P’alma, com cardápio da chef Luisa Veiga e carta de drinques de Jessica Sanchez. Fica em um casarão de meados do século 19, com quase 200 anos (de 1839) que foi sede da fazenda que ocupava a área: a arquitetura é um dos destaques do empreendimento.
Em outubro abriu as portas e cortinas o que promete ser um marco na indústria carioca do entretenimento. O maior cinema do Rio, que estava fechado, em vez de virar igreja, como se esperava, ganhou nova vida: é o Roxy Dinner Show, que serve um jantar seguido pelo espetáculo “Aquele Abraço”. A mais nova e exuberante casa de shows do Brasil busca resgatar o glamour de Copacabana da primeira metade do século passado, quando o antigo cinema, de 1938, foi inaugurado. A restauração do prédio durou quase dois anos, e foi fruto de um investimento de R$ 65 milhões, tendo como destaque principal a redescoberta da impressionante luminária original, que se tornou elemento central da decoração e é praticamente parte do espetáculo. Os menus vão mudar com certa frequência, ao contrário do show, que deve ficar um bom tempo em cartaz. O primeiro cardápio é assinado pelo chef Danilo Parah, à frente de casas como Rudä, em Ipanema, que vem ganhando prêmios como destaque na nova gastronomia brasileira. A cozinha está afinada, mesmo tendo um salão com capacidade para 680 pessoas. É o tipo de programa que todo o carioca deve fazer – no mínimo – uma vez na vida, assim como subir o Pão de Açúcar e o Corcovado.
O ano de 2024 se encerrou com uma novidade à moda antiga (e de viola). No final de novembro, o Capiau abriu as porteiras no Beco das Sardinhas, no Centro, com fogão a lenha e uma cozinha caipira, sob os cuidados dos chef Diego Melão, que foi trazido do Vale do Paraíba pelo agitador cultural e gastronômico Raphael Vidal. A comida ali tem sotaque do interior, com muita carne de porco na lata, tudo feito em panelões que cozinham tudo lentamente, como manda a tradição rural. A moela vem fazendo sucesso, e podemos encontrar ali pé de porco, e de galinha, além de um já famoso pão de queijo no disco de arado, servido com carne de lata, de bochecha suína, desfiada. O cardápio contempla feijoada, cozido, e aos domingos tem café da manhã caipira, a partir das 10h.
E, ao que tudo indica, 2025 vai ter muita novidade também. Só em Botafogo abriram as portas três novos bares, que já nasceram lotados: o Jurubeba Bar, do chef Elia Schramm; o Glorioso Sushi, da dupla Edu Araújo e Jonas Aisengart (Quartinho, Pope e Chanchada); e o Polvo Marisqueria, da chef Monique Gabiatti (Belisco e Polvo Bar). Que assim seja!