CULTURA: UMA ROSA É UMA ROSA… MAGALHÃES

A carnavalesca morreu em julho deste ano

Caroline Rocha

‘Rosa Lúcia não combina muito. Benedetti, é um inferno esse sobrenome, porque eu já fui Benedita, Bendita, Bernardete…”, relembra. De um misto de autenticidade e indignação nasceu a assinatura da maior carnavalesca da Era Sambódromo: Rosa Magalhães. 

A professora, como era conhecida pelo histórico acadêmico, dedicou mais de 50 anos de vida ao Carnaval – festa na qual se arriscou pela primeira vez em 1971, quando, em suas próprias palavras, “não sabia nada”. O depoimento da mulher que confeccionou desfiles antológicos, como “Bum Bum Paticumbum Prugurundum”, no Império Serrano, é um dos 160 relatos audiovisuais inéditos cedidos por grandes nomes do Carnaval ao projeto Memória das Matrizes do Samba do Rio de Janeiro, parte do acervo do Museu do Samba, declarado patrimônio histórico e cultural do estado.

O projeto documentou a trajetória de pessoas que ajudaram a formar a identidade cultural brasileira, seja no samba de terreiro, no samba de partido alto ou no samba-enredo. Entre os baluartes entrevistados, estão Mestre Mug, Alcione, Laíla, Tia Surica, Jamelão, Sônia Capeta e Dona Ivone Lara. Reconhecido como Centro de Referência de Documentação e Pesquisa do samba, o museu está localizado aos pés da favela da Mangueira, na Zona Norte do Rio, e reúne o maior acervo do gênero no Brasil, com mais de 45 mil itens.

A dama do Carnaval carioca

Diferentemente da batucada da Avenida do samba, Rosa preferia o silêncio. Nem mesmo para música no fone de ouvido abria exceção. Isso porque, desde muito cedo, habituou-se à calmaria, graças aos pais, grandes leitores e escritores.

O amor pela arte foi influenciado pela família, que também contava com a avó costureira e o avô que tocava violino. Começou a bordar aos cinco anos. O desejo da mãe era de que fosse pianista, mas Rosa sempre amou desenho e pintura. Antes mesmo de concluir o colégio, ela foi aprovada na Faculdade de Belas Artes. A artista plástica colecionou três graduações: pintura, cenografia e indumentária.

“Era uma época em que pouca gente fazia vestibular. O negócio era ‘terminou o colégio e casou’”, disse. Foi durante a universidade que a artista plástica e o Carnaval se cruzaram, por meio do convite de seu então professor Fernando Pamplona para ser assistente na confecção de figurinos do Acadêmicos do Salgueiro. “Eu comprei uma entrada e fui com um amigo meu [assistir ao desfile]. Eu disse ‘vou comprar umas entradas para a gente ver o que é isso”.

Da “ignorância absoluta” à mulher com mais vitórias na Era Sambódromo foram sete títulos – na Imperatriz, Império Serrano e Vila Isabel – e mais de meio século dedicados ao maior espetáculo da Terra. A última participação dela foi em 2023, na escola Paraíso do Tuiuti.

Rosa Magalhães também brilhou fora da Sapucaí. Ditou o espetáculo de cores e movimentos na cerimônia de abertura dos Jogos Pan-Americanos de 2007 e na festa de encerramento das Olimpíadas de 2016. O primeiro evento lhe rendeu o prêmio Emmy de melhor figurino.

Nascida em 08 de janeiro de 1947, Rosa faleceu em julho deste ano. Em sua entrevista ao Museu do Samba, não revelou qual dos tantos talentos preferia enquanto ofício: “Eu gosto do que eu estou fazendo naquele momento.” Questionada se valeu a pena a trajetória no samba, não hesitou ao responder: “Valeu! Vão ter altos e baixos, hora que vou estar muito feliz e que vou estar muito infeliz, mas enquanto houver Carnaval nós vamos levando!”