Bruno Rodrigues
Detentor do título de maior produtor de petróleo e gás do Brasil, o Rio de Janeiro se prepara para escrever um novo capítulo na história da energia do país. Se nos anos 1980 a Bacia de Campos foi a força propulsora que alçou o estado ao epicentro dos investimentos nacionais, hoje, são as energias renováveis que podem gerar uma nova fase de atração de interesse de empresas nacionais e estrangeiras.
A meta é ousada: fazer do Rio a capital verde do Brasil, como vem apregoando o prefeito do Rio, Eduardo Paes, desde 2021. A afirmação vem sendo endossada mês a mês pelas empresas, de gigantes como a Petrobras a companhias privadas nacionais e estrangeiras. Em um cenário de busca por projetos para reduzir a emissão de gases do efeito estufa, projetos e novas ideias não faltam.
A Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) atualmente tem 22 projetos em energias renováveis, em uma lista que inclui o promissor hidrogênio verde, a produção de biometano e a geração de eletricidade a partir do sol e do vento em alto-mar, com as eólicas offshore. Para especialistas, o Rio, que concentra mais de 70% da extração de petróleo, tem toda a condição de aproveitar o conhecimento com a indústria de óleo e gás para impulsionar os projetos renováveis e de baixa emissão de carbono.
“O Rio de Janeiro é referência em operação marítima na indústria de óleo e gás, com expertise em águas profundas e ultraprofundas nas bacias de Campos e Santos. Em convergência, a geração de energia renovável em alto-mar, como a eólica offshore, pode usar o conhecimento da indústria fluminense e infraestrutura offshore e naval”, avalia Karine Fragoso, gerente-geral de Petróleo, Gás, Energias e Naval da Firjan.
As expectativas são promissoras. De norte a sul, há um potencial de 15 projetos eólicos offshore, cinco empreendimentos em hidrogênio e duas fazendas de geração solar. Juntos, somam investimentos previstos de US$ 77,4 bilhões. Para Karine, os projetos já mapeados reforçam o papel do estado como hub de energia nacional. “A diversificação de projetos contribui também para a saúde do encadeamento produtivo, aumento das possibilidades de fornecimento e aquecimento econômico do estado e do país”, afirma Karine.
Quem ajuda a ilustrar esse novo cenário é a Petrobras. A estatal assinou recentemente um projeto de cooperação com o governo do estado do Rio de Janeiro para estudar a implantação de projetos de geração de energia a partir dos ventos em alto-mar no litoral norte do estado, perto do Porto do Açu. Em outra frente, a estatal investe em uma iniciativa para capturar e armazenar gás carbônico em Barra do Furado, em Quissamã, também na região norte do estado. Maurício Tolmasquim, diretor de Transição Energética da estatal, explica que a iniciativa envolvendo a captura de carbono é um projeto piloto.
“Vamos injetar o CO2 em um aquífero salino. Há um potencial enorme e podemos descarbonizar algumas indústrias. Estamos conversando com a siderurgia para ela comprar serviços e injetar o CO2 dela”, adianta Tolmasquim, lembrando que a empresa pode adaptar um de seus gasodutos para transportar apenas gás carbônico.
No atual plano de negócios da estatal, a previsão de investimentos em renováveis e transição energética é de US$ 11 bilhões e envolve ainda projetos com parques solares e hidrogênio. Segundo a estatal, a transição energética é impulsionada pela preocupação com as mudanças climáticas, a escassez de recursos naturais e a demanda crescente por energias mais limpas. “Há uma grande complementaridade de conhecimento da indústria de óleo e gás com a indústria de renováveis, tendo conhecimento e infraestrutura relacionados a combustíveis renováveis, o que gera sinergia”, complementa a estatal em nota.
No Rio, o Porto do Açu, o segundo maior do Brasil em movimentação de carga, é um dos destinos mais procurados por empresas de olho em projetos renováveis e de eficiência energética.
Segundo a companhia, o Porto desponta hoje como um dos três principais pontos do país para a instalação de eólicas em alto-mar. Para se ter uma ideia do potencial, até março deste ano, havia 183 gigawatts (GW) sendo licenciados ao longo da costa brasileira, dos quais 34 GW estão na região de influência do Porto do Açu.
Além disso, há iniciativas envolvendo biogás e hidrogênio renovável. Já foram assinados diversos memorandos de entendimento para a instalação de futuros projetos com empresas como Eletrobras, Corio, SPIC e TSE. Em meados de agosto deste ano, juntou-se a esse time a norueguesa Fuella AS, que assinou um contrato de reserva de área para o recém-licenciado hub de hidrogênio.
“As vantagens do Porto do Açu para implantar o maior hub de integração energética do país são significativas, pois há infraestrutura portuária, disponibilidade de água de uso industrial e de gás. E estamos montando um ecossistema competitivo, baseado em sinergias, criando ainda mais valor para o que é produzido no porto”, avalia Eugenio Figueiredo, CEO do Porto do Açu.
Na busca por uma matriz mais limpa no Rio, outra fonte que ganha destaque é o biometano, produzido a partir do processamento do biogás, que é gerado na decomposição natural de resíduos sólidos e do lixo urbano. A Gás Verde, que hoje produz 130 mil metros cúbicos diários (m³/dia) de biometano a partir de resíduos do Aterro Sanitário de Seropédica, vai ampliar a unidade para 150 mil m³/dia até o próximo ano, consolidando o empreendimento como o maior da América Latina.
Marcel Jorand, CEO da empresa, lembra ainda que será construída uma planta de CO₂ verde, a primeira do país oriunda de aterros sanitários e que deve ficar pronta no final de 2025. O projeto é estimado em US$ 10 milhões. O CO₂ verde é vendido para indústrias que utilizam o gás durante o processo fabril.
“Também temos duas térmicas a biogás que geram energia elétrica renovável em Nova Iguaçu e São Gonçalo e que serão transformadas em plantas de biometano. Juntas, as unidades do Rio devem produzir cerca de 350 mil m³/dia de biometano até 2026”, adianta ele.
Segundo Jorand, o Rio tem vocação para energia renovável. Para ele, os projetos são importantes para o desenvolvimento da economia fluminense, com geração de emprego e renda, a partir da atração de investimentos.
“Com nossos projetos, seguimos firmes com o propósito de apoiar o processo de descarbonização de grandes empresas instaladas no estado do Rio e que usam esse combustível nos seus processos produtivos. O biometano que produzimos abastece a siderúrgica Ternium, em Santa Cruz, a fábrica da Ambev, em Cachoeiras de Macacu, e outras indústrias, como a Saint-Gobain, a farmacêutica Haleon e a metalúrgica Vesuvius”, lista Jorand.
Karine, da Firjan, lembra ainda que há desafios. “Para impulsionar e concretizar esses investimentos, é preciso políticas públicas e regulação coerente com as particularidades do estado. Só assim vamos viabilizar a transformação desses projetos em resultado para a cadeia de fornecimento e a sociedade. Em paralelo, devemos aproveitar as oportunidades na capacitação dos profissionais e no desenvolvimento tecnológico que esses novos mercados de energia demandam”, diz ela.
Um comentário
Comentários estão fechados.