LAZER: ESTA CIDADE É COISA DE CINEMA

Gravação de filme em uma comunidade

Luisa Prochnik

Para ver – pelas telas em novos cinemas de rua – e para ser vista – através de seus cenários registrados por câmeras cinematográficas. Mais queridinha que Paris, a cidade luz, a maravilhosa cidade do Rio de Janeiro ultrapassou a capital francesa em número de dias de filmagem em suas ruas, em 2023: foram 7.885 diárias no ano contra 7,4 mil em solo parisiense. O Rio de Janeiro está sendo visto em novelas, séries, minisséries e videoclipes. E, também, está vendo mais a si e a outros inúmeros cenários com um pacote de cinemas de rua reformados e modernizados, ficando disponíveis aos cariocas que preferem alternativas de programa fora dos grandes shoppings centers. Nos bastidores do ver e ser visto, está a RioFilme, atuando com editais, leis de incentivo e através da Rio Film Commission, impulsionando a indústria do audiovisual em paisagens cariocas.

Na lista de cinemas de rua modernizados e reformados, já reabertos ou em vias de reabrirem suas portas, estão os CineCarioca Penha, Ponto Cine de Guadalupe, Cinemas do Grupo Estação, Cinemateca do MAM, Cine Santa, CineCarioca Nova Brasília e o CineCarioca José Wilker, em Laranjeiras. Os cinemas de rua têm uma relação forte com o local onde se estabelecem. Seja através de sessões gratuitas para crianças, projetos parceiros diversos conduzidos por líderes comunitários locais, como por revitalização e fortalecimento do comércio da região, através da atração de novos visitantes aos bairros, interessados em filmes de arte, mas, também, em produções comerciais. O Cine Santa, por exemplo, aos seus 20 anos de idade, apresenta-se com novidades tecnológicas e até com a bombonière e o café aprimorados diante de seus eternos fãs. A reinauguração do cinema foi com festas nas ruas do bairro bucólico, ao mesmo tempo, boêmio e festeiro, de Santa Teresa, além de DJ no comando das carrapetas, muitos sorrisos no rosto e bares ao lado com suas mesas tomadas por clientes.

— Ao estimular o cinema de rua a gente mexe com duas coisas muito importantes. Com a memória, com a identidade, com essa questão da afetividade com os espaços culturais, mas também com o aspecto econômico, com a capacidade que esses espaços têm de gerar emprego, gerar renda, gerar essa movimentação na vizinhança – contou Marcelo Calero, Secretário de Cultura da Cidade do Rio de Janeiro, entre uma música e outra.

E o Rio também está mais nas telas. Nas telonas do cinema e nas telas de televisão, com números que despertam a atenção e ganham de outras cidades concorrentes. Em 2023, as 7885 diárias de gravação, se distribuíram entre diversos projetos, como séries (49 produções), longa-metragens (60 produções), novelas (11 produções), vídeos de  publicidade (130 produções) e programas de reality show (9 produções). De forma resumida, em média, eram 21 gravações acontecendo todos os dias em locações cariocas. Os números são da Rio Film Commission, departamento que, hoje, funciona dentro da RioFilme, e centraliza demandas do audiovisual para gravações em locais públicos.

— A gente é um departamento autorizador de filmagens. Desde um curta metragem, à novela, à publicidade, à série, ao videoclipe, tudo passa necessariamente por nós – explica Daniel Celli, coordenador da Rio Film Commission, que resume —A gente percorre o caminho das pedras.

Tudo isso porque, antes, a cidade contava com o famoso jeitinho carioca e você tinha que conhecer alguém, que conhece alguém, que sabe quem é o outro alguém.  

— Então, tem previsibilidade. E essa palavra para a produção audiovisual é mágica. Você tem que ter, porque o espectador, que não entende de audiovisual, ele vê o produto pronto, na televisão, no cinema. Mas essa parte operacional de bastidores ninguém vê, só quem trabalha com audiovisual. Aí você garantir prazos, informações precisas, você garantir o procedimento padronizado, tudo isso faz com que o produtor fale: opa, eu quero filmar nessa cidade – reforça Daniel Celli.

A Coqueirão Pictures é uma produtora audiovisual sediada no Rio de Janeiro e uma das que recorrem à Rio Film Commission para locar cenários a produções diversas. Um dos filmes em cartaz é “A Festa de Léo”, dirigido por Luciana Bezerra e Gustavo Melo, produzido pela Coqueirão Pictures, em coprodução com Globo Filmes, Nós do Morro e Riofilme.

— Entre as principais locações estão: praia do Leblon, posto de saúde do Vidigal, Escola Municipal Almirante Tamandaré, avenida Niemeyer, campinho do alto do Vidigal – pontua Diogo Dahl, proprietário e produtor da Coqueirão Pictures.

Acerta quem disser que a Avenida Atlântica, banhada pela praia de Copacabana, internacionalmente conhecida, foi a locação mais buscada ano passado para produções audiovisuais, nacionais e internacionais. No entanto, outras paisagens, menos conhecidas fora da cidade, fazem sucesso como cenário. Um exemplo é Marechal Hermes, que recebeu 12 produções e 409 diárias na gravação de séries, ficando em terceiro no ranking geral por diárias. Já o bairro destaque na demanda por locações foi o Centro.

— Porque o Centro do Rio é maravilhoso, e tem muita filmagem de época (…). Para além disso, o Centro é grande, espaçoso, mas tem ruas pequenininhas —  diz Daniel Celli, que acrescenta 

– O Centro não necessariamente imprime o Rio de Janeiro. Nem sempre é interessante imprimir o Rio de Janeiro. Se você quiser apenas um centro urbano, funciona. Pode ser qualquer lugar, pode ser Montevidéu, pode ser Paris, pode ser São Paulo. A gente sempre pensa em atrair produção.

A maior atratividade da cidade está na diversidade de locações, na organização, previsibilidade às produtoras, na formação de profissionais capacitados, mas, também, como  em muitos lugares, há mecanismos financeiros: o cash rebate  é um deles, quando a cidade financia parte da produção em formato de reembolso, desde que a produtora siga determinados critérios pré-estabelecidos. Tudo  para fomentar a indústria audiovisual carioca.

— A gente dá dinheiro para atrair dinheiro e gerar emprego. Então, para além dos nossos editais tradicionais, a gente tem o cash rebate. O principal critério é o impacto socioeconômico na cidade. Então, a gente está pensando em atrair produções que não necessariamente filmariam no Rio – adiciona Daniel Celli. O cash rebate exige que o dinheiro reembolsado tenha sido investido na cidade e em profissionais da cidade.

Mesmo quem nunca foi à Nova York sabe como são os táxis de lá, os semáforos, os  bueiros, os  prédios. Foi lá, nessa cidade norte-americana, que, nos anos 60, surgiu a ideia de criar uma film commission, que ano a ano renova políticas para o setor audiovisual, recebendo investimentos e tornando-se uma cidade desejada de tanto aparecer nas telas de cinema e nas televisões de casa.

Então, prepare a pipoca, escolha um cinema de rua reformado, passeie pela região, conheça e consuma no comércio local e, ao ficar de frente para a tela, quem sabe, encontrará a sua cidade como cenário principal.