DO TIG AO GIG, COM GENTILEZA

O percurso total se estende por 26 quilômetros, e estima-se que até 250 mil pessoas sejam transportadas diariamente, até 2030

Aydano André Motta

Tem verbete novo no sempre mutante glossário da carioquice: TIG-GIG. Conhece? Dica: tem a ver com a mobilidade urbana e um novo equipamento que contribui para desatar o nó eterno de ruas e avenidas do Rio. Vamos começar pelo fim: GIG é a sigla aeronáutica do renascido Aeroporto Tom Jobim; TIG, a abreviação de Terminal Intermodal Gentileza, que une BRT, ônibus e VLT no projeto de racionalizar a ligação entre a maior parte do subúrbio, o Centro e a Zona Sul.
A ligação expressa, via pista exclusiva na Linha Vermelha, aproxima o maior terminal aéreo da região mais populosa da cidade. A viagem é feita por ônibus executivos (frescões, na gíria imbatível), e no Gentileza uma sala vip ameniza a espera dos passageiros. Sai um a cada 20 minutos, em operação diária, de 6h à meia-noite.
Terça-feira (2), o casal Rafael e Amanda Rizotti empurrava pequenas malas pela passarela em direção à Rodoviária Novo Rio, para cumprir a derradeira etapa da viagem que começou em Curitiba e terminaria em Arraial do Cabo. Na chegada ao Tom Jobim, descobriram o TIG-GIG e resolveram experimentar. “Excelente, chegamos mais rápido do que se pegássemos um táxi”, aprovou o turista.
O TIG-GIG é a cereja do bolo do Terminal Intermodal criado, na verdade, como destino para o BRT Transbrasil. A obra, iniciada no segundo governo de Eduardo Paes e interrompida na gestão do sucessor, o bispo Marcelo Crivella, transformou em inferno o vaivem na sempre complicada Avenida Brasil. Agora, perto do fim de seu terceiro mandato, o corredor expresso enfim entra em operação.
O percurso total se estende por 26 quilômetros, e estima-se que até 250 mil pessoas sejam transportadas diariamente, até 2030. Com radical redução no tempo de viagem – de Deodoro ao Centro, serão impressionantes 20 minutos. Uma terceira pista da Brasil ficará exclusiva para os ônibus comuns. Os carros que lutem, nas duas faixas restantes – e olhe lá, porque transporte individual é o veneno das metrópoles.
O Transbrasil se conecta às linhas de ônibus municipais, ao VLT que atravessa o Centro, a Transolímpica (Terminal Deodoro) e a Transcarioca (Penha e Fundão). As intervenções ao longo do corredor incluem, ainda, a construção de 18 passarelas. (Somando Transoeste, Transcarioca, Transolímpica e Transbrasil, serão 139 estações, 16 terminais e quase 150 quilômetros, interligando as zonas Oeste, incluindo a Barra, Norte e Centro.)
Localizado na entrada da região mais adensada do Rio, ao lado da Rodoviária e sob o emaranhado de viadutos que arrematam Ponte Rio-Niterói e Avenida Brasil, o Gentileza chama atenção pela funcionalidade da construção. Não tem luxo desnecessário, consequência do reaproveitamento das estruturas metálicas do Centro Internacional de Transmissão, construído no Parque Olímpico para os Jogos de 2016.
Dos planejados 150 mil passageiros diários, só chegou pouco mais da metade. Eles encontram generosa oferta de profissionais com a camisa “posso ajudar?”, mas quase todas as 80 lojas ainda fechadas – até o início de abril, só funcionava a BomdiQueijo, de nome autoexplicativo. Por toda a construção, o layout remete às frases do personagem que batiza o lugar, José Datrino, o Profeta Gentileza, inscritas em 56 pilares dos viadutos do Gasômetro e Perimetral. A prefeitura, aliás, restaurou os escritos como extensão da obra.
O terminal ocupa 77 mil metros quadrados numa área antes abandonada – “O que tinha aqui antes?”, muita gente pergunta aos funcionários – comprada à Caixa por R$ 40,8 milhões. O investimento na construção foi próximo de R$ 300 milhões pela Parceria Público Privada (PPP) do VLT do Centro, sendo R$ 257,8 milhões financiados pelo Banco do Brasil para a reestruturação do sistema BRT.
Cinco novas linhas de ônibus foram criadas para aproximar vários bairros do terminal recém-inaugurado: 161 (Ipanema via Rebouças), 163 (Copacabana via Rebouças), 165 (Cosme Velho via Santa Bárbara), 167 (Urca, via Botafogo e Cinelândia) e SP265 (Marechal Hermes via Madureira). A Prefeitura aposta nos ônibus no duelo com os carros de passeio – em especial o transporte por aplicativo, praga que só faz crescer.
O TIG, assim, integra três modais: o novo BRT Transbrasil, o VLT e 20 linhas de ônibus municipais regulares. Bibelô dos modais, o trenzinho silencioso oferece duas linhas – a 1, que leva ao Aeroporto Santos Dumont, e a 4, até a Praça 15. Governo Federal e Prefeitura do Rio foram parceiros na implementação do VLT, com investimento de R$ 532 milhões de recursos federais do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) da Mobilidade.
Então, ficamos combinados assim: contra o trânsito caótico, Gentileza é o caminho.