BOTAPOLVO: O MELHOR BAIRRO DO RIO PARA COMER TENTÁCULOS, E MUITO MAIS

Polvo à lagareiro no Sardinha: com vista

Bruno Agostini

Tem sido muito comum nos últimos anos: guias internacionais colocam Botafogo como um dos bairros mais divertidos e agradáveis do mundo, pela diversidade de tribos que ali se encontram, envolvendo gastronomia, moda, cinema e artes, como um todo. Como aconteceu recentemente com a “Time Out”, que botou Botafogo entre os 10 bairros mais legais do mundo. Essa atmosfera moderna, que aponta tendências e serve de incubadora para iniciativas que estão antenadas com o que acontece de novo no mundo do entretenimento, levou o reduto carioca a ganhar um apelido: BotaSoho, referência óbvia ao bairro nova-iorquino.

Eu, recentemente, apelidei de brincadeira de BotaPolvo, igualmente por motivos auto-explicáveis. É notável a quantidade de lugares, das mais distintas possibilidades gastronômicas, que servem esses moluscos das mais variadas maneiras: tem desde as receitas ancestrais, de origens ibéricas, como um belo arroz de polvo; até criações recentes, irreverentes, como a coxinha, que é servida apenas às quartas no bar que presta reverência até no nome: é o Polvo Bar, da chef Monique Gabiatti, que naturalmente é especialista no riscado. Tem em diversos formatos e temperos. Para comer com as mãos, o hot polvo, o pastel e o taco são pedidas infalíveis. Para petiscar, tem vinagrete; e, como prato principal, um belíssimo lagareiro, no nível dos grandes portugueses da cidade – o que não é fácil.

Aliás, falando nisso, a quantidade de bons restaurantes portugueses no bairro engrossa a lista de lugares que me fizeram pensar nesta reportagem: além de tudo, tem o EA (ex-Entreamigos), a Tasca da Mercearia e o Sardinha, isso para falar de marcas e endereços (relativamente) recentes. Mas, sem esquecer do mais antigo de todos no ramo da gastronomia em Botafogo, a histórica Aurora, casa fundada em 1898, sendo um dos restaurantes mais antigos do Rio, que está se renovando, sem perder as origens.

Localizada na mesma esquina da Rua Capitão Salomão com a Visconde de Caravelas já se vão mais de 125 anos, a Aurora está remodelando o menu, e o próprio conceito da cozinha. Mas, de lá, não pode sair o arroz de polvo à portuguesa (para duas ou três pessoas). A receita foi adaptada pela chef Ana Beatriz Capão, que tem viajado a Portugal com regularidade em busca de inspiração. Assim, ela fez um preparo típico de lá, deixando mais caldoso, no estilo “malandrinho”, com brócolis e tomates refogados ao vinho branco.

Na Tasca da Mercearia o polvo crocante é um dos carros-chefes do cardápio, e pode ser servido como entrada, em versão aperitivo, para petiscar, lambuzado com azeite verde de salsa e coentro; ou como prato principal, em montagem certeira, que leva chouriço português, arroz de tomate, farofa crocante de panko e manteiga de páprica. O polvo adorna, ainda, a espetada de frutos do mar, com lula, peixe, camarão, cebola e pimentão, com azeite de cítricos.

No Sardinha, no Botafogo Praia Shopping, com vista para o Pão de Açúcar, o polvo também é uma das estrelas do menu. Pode ser aperitivo, em forma de vinagrete; no arroz de polvo (um dos pratos do dia, servidos no almoço, de segunda a sexta); no misto do mar com chouriço (com camarão VG, tamboril e lulinhas) e à moda das Beiras, com molho de chouriço e batatas ao murro.

Já no EA, herdeiro do espólio gastronômico do Antiquarius, são servidas quatro versões: no arroz de frutos do mar (cozido com caldo de frutos do mar e coentro, com polvo, lula, camarão, cavaquinha e tamboril), no tradicional arroz de Polvo cozido no próprio caldo com pimentão; no à lagareira (frito no azeite e assado no forno, com batatas em rodelas, cebolas, azeitonas e brócolis, e regados no azeite e alho) e na feijoada de frutos do mar, com feijão branco, cozido com caldo dos pescados, que tem, além do polvo, lula, camarão, cavaquinha e tamboril).

Peruanos são especialistas no assunto também, com o polvo ganhando destaque em várias preparações tradicionais. No Lima, ele compõe o ceviche criollo, ao lado de peixe do dia, camarão e lula, com leite de tigre, pesto de coentro e crocantes de milho). Na parte dos pratos principais, dois dos mais destacados levam tentáculos, que são assados na brasa: no pulpo y papa ele vem com batatas apimentadas, molho de azeitona e chimichurri de bacon, e na parrillada marina, o serviço traz à mesa polvo, camarão, lulas e mexilhões, com batatas, cogumelos, tomate-cereja e chimichurri, com arroz negro na tinta de lula.

No Ceviche Rio podemos encontrar três preparos clássicos do país que têm o polvo como protagonista: pulpo al olivo, em finas fatias, tipo carpaccio, temperadas ao molho de azeitonas pretas; e a causa de pulpo, uma espécie de bolinho frio de batata, um purê de textura firme, coroado com abacate, tomate e ovos de codorna, além dos tentáculos, e o ceviche misto, com peixe do dia, camarão, lula e polvo, em preparo com cebola roxa, pimenta dedo-de-moça, batata-doce, milho e leche de tigre.

No Belisco, um bar de perfil jovem, focado em petiscos bem bolados e vinhos naturais, que têm a cara de Botafogo, o polvo também brilha no menu, que também é criação da chef Monique Gabiatti, que tem como sócias a sommelière Gabriela Teixeira e a empresária Sálua Bueno. Ali, ela serve outras três receitas: vinagrete do mar, com polvo, camarão e lula; o polvo com nhoque salteado, com jus do próprio, e furikake, com aioli de missô; e na panelinha de frutos do mar, com camarão, polvo e lula, preparados no molho de tomate com azeitonas e alcaparras.

Dois dos protagonistas dessa cena gastronômica de Botafogo, os empresários Edu Araújo e Jonas Aisengart abriram o Quartinho, há quatro anos, e o Chanchada, há dois, contribuindo com a fama internacional do bairro, ganhando destaque nessas reportagens da revista  “Time Out”, e outras. No primeiro, que já ofereceu um sanduíche de polvo que deixou saudades, é servida uma conserva de polvo tipo vinagrete, acompanhada pelo brioche da casa, dourado na manteiga, enquanto no segundo eles preparam o vinagrete do mar, com polvo e camarão, além de tomate-cereja, marinados no suco de limão-cravo.

Outro personagem importante de Botafogo, o nova-iorquino Sei Shiroma, do Ferro e Farinha, em breve vai abrir ali uma filial do Suibi, seu restaurante asiático, inaugurado no final do ano passado, no Leblon, onde serve nigiris e sashimis de polvo. Por enquanto, vale investir nos preparos da pizzaria, que usa o forno não só para assar os discos de massa com coberturas variadas, e bem originais. Ali, no calor que ultrapassa os 400 °C, ele prepara um ragu de polvo, em molho de tomate, com linguiça da casa, e fregola (massa da Sardenha, de semolina), com toque de grana padano. Além das torradas que acompanham o carpaccio de polvo, enriquecido com vinagrete de tomate, maionese de ostras, rúcula e grana padano.

Quase assim como Garrincha, Botafogo é a alegria do polvo.