Aydano André Motta
A primeira noite da maratona dos desfiles na Passarela do Samba apresenta, como grande atração, uma novata cheia de ambição na aldeia dos bambas. A União de Maricá estreia na Série Ouro determinada a impressionar plateia e jurados da segunda divisão do paticumbum. Sem nervosismo de estreante, tampouco modéstia de quem acabou de chegar – a escola está na briga pelo acesso ao Grupo Especial.
Basta ver o elenco badalado de profissionais, quase todos com presença ou passagem na elite da festa. A começar pela porta-bandeira Giovana Justo, cria da Mangueira e uma das poucas, em toda história carnavalesca, com títulos por duas escolas, a verde e rosa e a Unidos da Tijuca. Ela forma com o experiente mestre-sala Fabrício Pires um casal nota 10.
Por todos os segmentos há profissionais do primeiro time. A comissão de frente tem a autoria do coreógrafo Patrick Carvalho, também do Salgueiro, criador de trabalhos lendários, entre eles o que abriu o desfile de 2018 do Paraíso do Tuiuti. O intérprete Nino do Milênio, ex-Mocidade, divide a condução do canto com o prata da casa Matheus Gaúcho. A Maricadência, bateria comandada pelo mestre Paulinho Steves, sustenta o virtuosamente o ritmo.
A tricolor (vermelho, branco e dourado) tem, na direção de Carnaval, Wilsinho Alves, também do Salgueiro e campeão na Vila Isabel. O dream team se completa com carnavalesco André Rodrigues, artista emergente da festa, revelado na Beija-Flor e hoje na Portela, criador (ao lado de Kamila Maria, Igor Trindade e João Vitor Silveira) do enredo “O esperançar do poeta”. O principal homenageado será Guaracy Sant’anna, o Guará, autor de obras marcantes como “Sorriso Aberto”, “Problema Social” e “Singelo Menestrel”.
“A ideia nasce quando constatamos como compositores que dialogam tanto com o nosso mundo são, infelizmente, desconhecidos e não recebem os devidos louros”, pontua Rodrigues. “Ao analisarmos como essas letras falam com a gente, pensamos no conceito do ‘esperançar’, de Paulo Freire, sobre ter esperança a partir de uma ação ativa e não de espera”.
Falecido em 1988, Guará ganhou três Estandartes de Ouro, sendo um pela Em Cima da Hora, com o antológico samba-enredo “33 – Destino Dom Pedro II” (1984 e reeditado em 2022). Trecho: “O suburbano quando chega atrasado/ O patrão mal-humorado/ Diz que mora logo ali/ Mas é porque não anda nesse trem lotado/ Com o peito amargurado/ Baldeando por aí/ Imagine quem é lá de Japeri”.
João Vitor Silveira, pesquisador destaca o simbolismo do Carnaval como esperança aos estratos mais desassistidos da população. “Vamos mostrar as dinâmicas de realidade que acabam inspirando as composições”, detalha. “Pensamos na violência, na falta de acesso a estudo, trabalho e moradia, e como a música, em especial o samba-enredo, é instrumento de construção de um amanhã melhor, além de transformar essas pessoas em reis e rainhas do Carnaval”.