UM BATE-PAPO COM CELSO PANSERA, PRESIDENTE DA FINEP

Jan Theophilo

Ele não tem um De Lorean DMC-12 capaz de avançar e retroceder décadas como na clássica trilogia estrelada por Michael J Fox e Christopher Lloyd. Tampouco uma máquina do tempo, como no romance de 1895 de HG Wells. Em compensação, Celso Pansera, o novo presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), um dos principais órgãos de fomento à inovação no Brasil, assume o cargo e um talão de cheques com R$ 10 bilhões anuais na conta pelos próximos quatro anos para fazer acontecer no projetos portadores de futuro. O país agradece.

Gaúcho nascido em 1963 em São Valentim, Celso despontou na política pela extremíssima-esquerda. Militante da corrente trotskista Convergência Socialista (mais conhecida hoje como PSTU), o estudante de Letras da UERJ foi secretário-geral da União Nacional dos Estudantes (UNE) entre 1989 e 1991. Afastou-se da turma que contra burguês vota 16 para completar os estudos. E em 2009 chegou à presidência da Fundação de Apoio à Escola Técnica do Estado do Rio de Janeiro (FAETEC- RJ), onde permaneceu até 2014 quando trocou de mal com o PT e foi eleito deputado federal pelo PMDB-RJ.

Em 2015 foi indicado pela presidente Dilma Roussef como sucessor de Aldo Rebelo no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. No ano seguinte, deixou o cargo para poder votar contra a admissão do processo de impeachment, mas não retornou ao ministério no governo de Michel Temer por solicitação do partido. Na Câmara, votou contra a Reforma Trabalhista e a favor do processo em que se pedia abertura de investigação do então presidente. Finalmente retornou ao PT, mas não conseguiu se reeleger, obtendo 15 mil votos. A convite do prefeito Washington Quaquá, assumiu então o Instituto de Ciência, Tecnologia e Inovação de Maricá (ICTIM).

Agora à frente da Finep, Celso tem a missão de conduzir projetos vultosos e de grande importância estratégica para o Brasil, como a famosa obra de igreja do submarino movido a propulsão nuclear, a conclusão de Angra 3 e a ampliação da capacidade de enriquecimento de urânio em Resende, entre outros empreendimentos. Todos os projetos na casa das dezenas de bilhões. Entre uma e outra reunião, Celso recebeu a reportagem de Rio Já para um ‘papo-cabeça’.

“Eu tenho minhas tarefas, apenas acrescentei novas, como a necessidade de ir a Brasília toda semana. Com isso minha vida ficou muito instável”, comentou, brincando: “Para você ter uma ideia, enquanto conversamos estou aproveitando para fazer assinatura do canal para tentar ver os jogos da Champions League antes de dormir”.

l Rio Já: Apesar de não vencer no Rio, a esquerda emplacou um número expressivo de cargos no primeiro escalão do governo Lula. O Rio ganhou o que não entregou?

Celso Pansera: A primeira coisa fundamental a destacar é que a vitória do Lula sobre o Bolsonaro foi muito relevante para o Brasil. Nesse contexto, a esquerda do Rio está bastante valorizada com este conjunto de cargos que são muito relevantes para a gestão da União e que podem trazer um novo ciclo para o estado, de desenvolvimento econômico e social.

De que maneira?

Acredito que atuando em áreas como o turismo,  do qual o Rio é notoriamente porta de entrada para o país; investindo no sistema de inovação, no desenvolvimento do complexo industrial da saúde; e, fundamentalmente, em uma retomada da indústria da área nuclear, com a conclusão de Angra 3, a ampliação da capacidade das Indústrias Nucleares Brasileiras (INB) de enriquecimento de urânio e a aceleração do processo de construção do submarino nuclear.

Qual sua avaliação sobre a política de investimentos em inovação e tecnologia no governo Bolsonaro?

O importante agora é olhar para frente. O Rio, por exemplo, tem plenas condições de se tornar um grande hub tecnológico, ou seja, um local que agrega vários produtos ou serviços ao mesmo tempo, onde você encontra a solução para seu problema ou necessidade, mesmo que exija diferentes tipos de serviço e especialidades, dentro do mesmo lugar. E este é o melhor momento que nós temos para fazer isso acontecer.

Por quais motivos?

Porque temos o BNDES, agora com uma forte política de inovação e reindustrialização; a Petrobras, que vai criar um fundo para tecnologia e inovação e temos a Finep, que terá nos próximos quatro anos o maior orçamento da sua história. Se soubermos aproveitar esse momento, podemos de fato iniciar um novo ciclo. Se executados todos os recursos disponibilizados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) dá algo acima de 10 bilhões por ano. Além disso, você tem a conclusão de Angra 3, que representa algo em torno de R$ 20 bilhões; a construção do submarino que não sei estimar agora, mas são mais alguns bilhões; na ampliação da capacidade de enriquecimento de urânio em Resende pela INB, processo que trará autonomia para o Brasil, tanto para a defesa, quanto para a produção de energia e na a fabricação de radiofármacos, destinados ao diagnóstico e tratamento do câncer e outras doenças. O Brasil caminha para se tornar autossuficiente e vai precisar de muito urânio enriquecido nos próximos anos.

Estamos assistindo a uma verdadeira mudança geracional no comando do PT. Saem de cena nomes como José Dirceu, Genoíno, Okamoto, e despontam novas lideranças como Alexandre Padilha, Flavio Dino, Paulo Pimenta – que assim como você entraram na política via movimento estudantil dos anos 1980. Como você enxerga essa mudança? A Geração Coca-Cola chegou lá?

Essa geração pegou o final da Ditadura Militar, acompanhou as mobilizações e discussões da Constituição atual. Mas ela viveu um grande momento que foi o impeachment da Dilma, um momento que marcou de forma indelével a esquerda brasileira. Essa geração estava começando a se destacar naquele momento. E não só foi para a trincheira de combate ao Bolsonarismo, como teve papel de destaque na vitória sobre o fascismo e na eleição do Lula. E agora pode cumprir um papel muito importante nos próximos 10, 15 anos na defesa da Democracia e da retomada do desenvolvimento econômico, social e da soberania nacional.