Washington Quaquá
Toda grande nação almeja deixar sua marca cultural no mundo, conquistar mentes e corações com seus valores mais significativos. Como caldeirão cultural do planeta, o Brasil não pode agir de forma diferente. Temos ritmos notáveis, como a bossa nova, que por sua qualidade nos exportou para os continentes. O samba, por outro laudo, não teve a mesma sorte. Ainda.
Assim como tudo que vem da cultura popular, o samba tem sido relegado ao segundo plano em nosso próprio país. Os formuladores de políticas públicas parecem não compreender ou sequer enxergar a inquestionável força que o ritmo e o carnaval têm demonstrado na geração de riqueza e, principalmente, empregos na indústria, no comércio e nos serviços diversos. Tampouco conseguem vislumbrar a riqueza que o Brasil tem a ganhar com a exportação de sua cultura, tal a força de atração que este ritmo irresistível tem potencial para exercer no turismo internacional.
Para se ter uma ideia, somente na cidade do Rio de Janeiro, a festa movimentou R$ 4,5 bilhões. O cálculo está no estudo Carnaval de Dados, uma publicação da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação (SMDEIS) em parceria com o Instituto Fundação João Goulart e com a Riotur, a empresa municipal de turismo.
Embora os números sejam impactantes, essa potência econômica e cultural não tem recebido a devida atenção do campo da política nacional. Não há incentivos ou políticas públicas claras para o setor, que a cada ano precisa se reinventar para crescer ou até mesmo para sobreviver, como ocorreu durante a pandemia da covid-19 com os milhares de trabalhadores e empreendedores do carnaval.
O improviso e o pouco caso precisam acabar em relação ao samba e à nossa maior festa. Neste sentido, começamos a luta para fazer o samba entrar na agenda oficial do Poder Legislativo. A criação de uma Frente Parlamentar em Defesa do Samba e Valorização do Carnaval Brasileiro é a primeira proposta que levo à Mesa Diretora da Câmara dos Deputados nesta legislatura.
O tabuleiro do grande jogo concorrencial entre as potências é, todo ele, pontilhado por ofensivas de natureza cultural. O samba é o patrimônio cultural mais valioso que temos no Brasil, por ser a revelação de nossa alma libertária e diversa. Dorival Caymmi, um dos muitos cariocas nascidos na Bahia, foi certeiro ao diagnosticar que é ruim da cabeça ou doente do pé quem não gosta de samba. Além de profundamente equivocado, eu diria, no caso dos gestores públicos que renunciam à nossa mais principal arma para competir na guerra da indústria cultural.
Um dos objetivos da frente parlamentar que propomos será abrir mecanismos para a profissionalização do setor, que carece de incentivos e políticas específicas. Afinal de contas, preparar um desfile de Carnaval é uma tarefa hercúlea, que exige administração de recursos e disciplina. Hoje, muitos dos que se dedicam ao carnaval são movidos pelo amor ao samba, mas precisam estar mais bem capacitados e treinados.
Levar o debate sobre o samba ao Congresso Nacional é tarefa urgente. Fruto de uma cultura genuinamente brasileira, o samba tem o potencial de quebrar ciclos geracionais de pobreza e diminuir a desigualdade no país. É preciso que encontremos caminhos seguros não só para garantir a sobrevivência do samba e do carnaval, mas para fortalecê-los enquanto produtos de identidade nacional e de exportação. Chegou a hora de valorizar esse diamante que veio das classes populares e da favela. Precisamos de mais samba na política.
*Washington Quaquá é deputado federal pelo PT-RJ e vice-presidente nacional do PT