PROGRAMA DA ALERJ ARTICULA EQUIPAMENTOS CULTURAIS

Com menos de um ano de implementação, e temporariamente suspenso devido à pandemia, o projeto “Caminhos do Brasil-Memória” deixou as ruas do entorno da Praça XV para ingressar solene na academia. O programa, lançado em outubro de 2019 pela Subdiretoria-geral de Cultura da ALERJ em parceria então com outros 11 equipamentos culturais, cresceu, apareceu, e virou dissertação de mestrado em “Projetos Sociais e Bens Culturais” na Fundação Getúlio Vargas, assinada por Fabiane Carnevale, museóloga formada pela Uni-Rio. Além de quatro novas instituições que se uniram ao grupo inicial, vem aí uma nova etapa do projeto, com o lançamento em 2022, ano do Bicentenário da República, do “Caminhos do Brasil Memória – Cinelândia”. “Havia uma pauta comum de reivindicações como reforço na segurança, iluminação pública adequada e melhorias na acessibilidade e mobilidade urbana”, lembra o subdiretor-geral de Cultura da Alerj, Nelson Freitas. Dessa confluência de interesses em comum 11 instituições se organizaram para lançar em outubro de 2019 o projeto “Caminhos do Brasil Memória – Praça XV”, cujo grande destaque foi o passaporte que garante gratuidade em todos os museus do Centro Histórico Praça XV.

Apesar do impacto das medidas de distanciamento social, que obrigaram equipamentos a cerrar suas portas e limitaram o período estudado, Fabiana avaliou de forma positiva os primeiros meses da iniciativa. “O “Caminhos do Brasil-Memória” é um exemplo de investimento em gestão de sistema integrado de museus. Ele funcionou? Sim, e tem todo o potencial para alavancar ainda mais. Esse projeto fez com que outros gestores saíssem de suas próprias caixinhas, conhecessem as outras instituições e começassem a ter noção de território”, diz ela: “Antes o CCBB poderia pensar que o território dele compreende só aqueles intramuros. Agora ele entende que tem de dialogar com o Centro Cultural dos Correios, que tem de dialogar com o Palácio Tiradentes e assim por diante”. Fabiana reconhece que a construção desse diálogo é um processo longo e, muitas vezes, complicado. “É fundamental que alguns gestores entendam a importância do engajamento. Não basta ir a reuniões, dizer que faz parte e apenas abrir as portas”, afirma a museóloga. “Eu não consigo entender como se pode fazer atividades nos equipamentos sem saber exatamente quem é seu público-alvo”.

            Para o subdiretor-geral de Cultura da ALERJ, Nelson Freitas, a dificuldade apontada pela pesquisadora é real, e se manifesta justamente em função do aspecto inovador do programa. “O trabalho em rede é raramente colocado em prática no Brasil, não está presente nem nas diretrizes de governo e nem da iniciativa privada, como se vê em alguns países da Europa”, aponta Nelson. “Estamos encontrando unidade de trabalho, é um processo. A troca de interesses em comum pelas instituições já aponta para as perspectivas de melhoria e ampliação do programa”. E o caminho de tijolos dourados rumo ao sucesso pode estar no aspecto mais lúdico e conhecido do “Caminhos do Brasil-Memória”.

            Quando o projeto começou a ser trabalhado, em abril de 2019, o grande destaque foi o passaporte, que garantia a gratuidade na entrada dos museus do Centro Histórico Praça XV.  Para cada equipamento visitado, havia um carimbo exclusivo em estilo retrô. Além disso, foi viabilizado o desconto de 45% no Edifício Garagem Menezes Cortes aos fins de semana e, uma vez que todos os espaços fossem visitados, o portador ganhava 50% de desconto no Aquário Marítimo do Rio de Janeiro (AquaRio) e a gratuidade de uma experiência no Espaço Cultural da Marinha. O projeto recebeu apoio das mais diversas instituições no âmbito municipal, estadual e federal. E, antes da pandemia, uma reivindicação dos gestores dos equipamentos, foi apresentada à Polícia Militar pelo presidente da ALERJ, deputado André Ceciliano, e plenamente atendida. Em dezembro foi criado um projeto especial de patrulhamento da área, com mais 20 policiais somados a cinco viaturas do 5º Batalhão da PM, para ficar de prontidão em pontos estratégicos, reforçando o efetivo do Centro Presente e da Guarda Municipal. Aproximadamente seis mil passaportes foram distribuídos.

            “Assim que eu vi o passaporte pela primeira vez, percebi que havia ali um potencial absurdo de estudo de público”, diz Fabiana Carnevale. “Ele é nominal, ou seja, basta anotar em cada equipamento o nome da pessoa na hora do carimbo. Desse modo a gente tem o check in do João, que no dia tal esteve no Paço, no CCBB e no Palácio Tiradentes. Ou o da Maria, que foi na Ordem do Carmo e no Centro Cultural dos Correios. Cruzando essas informações a gente pode começar a entender quais sãos os equipamentos mais e os menos visitados e o porquê. O passaporte pode nos dar subsídios e mais respostas do que ser apenas um souvenir”.

            Fabiana costuma dizer que é uma militante da museologia. “Porque para tratar com cultura e patrimônio no Brasil só sendo um sobrevivente”, ironiza. Pouco depois de formada mudou-se para Aracaju, convidada pela Secretaria Estadual de Cultura de Sergipe para chefiar os museus do estado. Durante sua passagem pelo cargo, firmou importante convênio com os Museus Capitolinos, de Roma, um conjunto de palácios romanos que abrigam uma vasta e importantíssima coleção de obras de arte, e viveu sete anos numa louca ponte-aérea. Em 2018 entrou para a Força Aérea Brasileira, como oficial temporária, após ser chamada para chefiar o setor educativo do Museu Aeroespacial, em Campo dos Afonsos. Mas já com a ideia do mestrado no radar, pediu transferência para o Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica, mais próximo à Fundação Getúlio Vargas.

            “Eu já conhecia passaportes semelhantes na Itália, que trabalhavam essa ideia de livre acesso. Só que quando vi funcionando o “Caminhos do Brasil-Memória” pensei: “ninguém ainda estudou os processos de sistemas integrados museais por aqui”. Então quis estudar a gestão desse processo. Como eu já estava terminando uma outra pós-graduação em gestão de museus, tudo coincidiu”, lembra. Indagada sobre se já é possível afirmar se o programa iniciado na Praça XV deu certo ou não, a museóloga é taxativa: “Agora os gestores estão pensando na maneira do território e não da sua realidade intramuros. Isso é a maior prova que funcionou”.